segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Fique de olho: quem paga a conta é sempre você


DESCASO DOS PREFEITOS COM RECURSOS DA SAÚDE É DENUNCIADO PELA CGU
Por: Luciano Augusto


O descaso dos prefeito brasileiros, aí incluindo pelo menos dois do Ceará, o de Acopiara, Antonio Almeida e o de Milhã, foi apontado pela Controladoria Geral da União(CGU). Os números assustam e mostram a rede de irregularidade que se sanada poderia solucionar o problema da saúde brasileira. Novamente, quem está no alvo dessas denúncias de corrupção é a Fundação Nacional de Saúde, a Funasa, presidida pelo advogado cearense Danilo Forte.
Leia mais sobre esse assunto em matéria do jornal Correio Brasiliense:
Tema do dia - sangria na saúde
Descaso e má-gestão de prefeitos
CGU constata diversas fraudes, como a utilização da verba para compra de enfeites natalinos e salgadinhos
Alana Rizzo e Thiago Herdy
Do Estado de Minas

A esperança de melhorias nas condições de saúde de milhões de brasileiros se desfez nas mãos de prefeitos que receberam recursos federais para obras e compra de equipamentos, iniciaram os projetos mas não os levaram até o fim. Objetos de convênios inacabados representam a maior fatia dos R$ 426,4 milhões da saúde que desapareceram no submundo da política e da má-gestão nos últimos cinco anos, segundo os relatórios da Controladoria-Geral da União (CGU). Foram R$ 73,8 milhões, quase 20% do total.
Os documentos de fiscalização produzidos pelos auditores são ilustrados com centenas de imagens que dão a dimensão exata do dano à União e citam exemplos de diversas naturezas. São José do Divino, na Região do Rio Doce, em Minas Gerais, recebeu R$ 209 mil para furar seis poços artesianos, mas concluiu apenas dois. Em Abadiânia, em Goiás, os recursos eram para a construção de um aterro sanitário, mas a obra ficou incompleta e o lixão ainda é usado na cidade (leia abaixo). Esqueletos de concreto e tubos sem função foi o que encontraram os técnicos da CGU ao visitarem as obras do sistema de esgoto de Alegre, no Espírito Santo. As obras do posto de saúde da rodoviária de Acopiara, no sertão do Ceará, estão paradas há dois anos.
O segundo lugar no ranking de irregularidades no uso da verba federal da saúde ficou com as despesas realizadas em desacordo com as determinações de portarias do Ministério da Saúde ou usadas para cobrir buracos da administração municipal. Foram R$ 70,1 milhões gastos em ações com objetivos diferentes do combinado — desde cobertura de folhas de pagamento de servidores de secretarias diversas, aluguel, tarifas bancárias e contas de consumo a despesas inimagináveis, como eletroeletrônicos, acessórios femininos, cosméticos, salgadinhos e enfeites natalinos. Despesas sem comprovação representaram 14,3% do total de gastos irregulares. As prefeituras não conseguiram mostrar aos técnicos da CGU como usaram R$ 60,8 milhões transferidos aos cofres municipais. Problemas de toda ordem relacionados a processos de licitação foram responsáveis por um prejuízo de R$ 52,9 milhões, ou 12,4% do total.
São relatados casos como o de Itaberaba, na Bahia, em que a empresa do irmão do prefeito apresentou uma proposta maior que a do concorrente e mesmo assim ganhou o certame. Ou então de Érico Cardoso, também na Bahia, onde todas as obras fiscalizadas pela CGU foram licitadas e vencidas por empresas ligadas ao prefeito e executadas por operários da administração municipal. A repetição dos mesmos erros de português em propostas de concorrentes foi um dos elementos que ajudaram os auditores a descobrir que o processo de licitação fora forjado em Acaraú, no Ceará.



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O verme da corrupção
Dos R$ 1,6 bilhão destinados ao setor, R$ 426,5 milhões desaparecem no submundo da política e da má-gestão
Alana Rizzo, Maria Clara Prates e Thiago Herdy
Do Estado de Minas

De norte a sul do país, a corrupção, o desperdício e a má-gestão desviam do dinheiro público investido na saúde a cifra milionária de R$ 426,5 milhões. O valor equivale a 25% dos R$ 1,6 bilhão, repassados pelo Ministério da Saúde, nos últimos quatro anos, a 1.341 municípios, dos 5.562 existentes no Brasil. Os dados são oficiais. Estão nos relatórios de fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU). O Correio e o Estado de Minas fizeram minucioso e inédito levantamento desses dados, montaram um banco de dados que possibilita uma radiografia detalhada do ataque ao erário e percorreram as cinco regiões do país para comprovar as irregularidades.
As informações jogam por terra a idéia de que falta investimento público na área da saúde. Em temporada de discussão sobre fontes de financiamento, se CPMF ou CSS, os números comprovam que o problema está nas administrações municipais, que não se constrangem em investir recursos do Programa de Atenção Básica na promoção de festas, confecção de abadás para carnaval temporão, compra de eletrodomésticos, ou, simplesmente, desviar o dinheiro por meio de inúmeras licitações fraudulentas.
A União, gestora dos recursos, também tem sua parcela de responsabilidade no desperdício, que penaliza especialmente as comunidades mais carentes, em estados pobres ou ricos. Na gastança da cifra bilionária, ela lava as mãos com a ausência de fiscalização e a falta de controle na liberação das verbas. Uma simples análise nos convênios da Fundação Nacional de Saúde, para saneamento público revela um esquema de corrupção que começa com a aprovação de obras sem projetos, alteração da proposta sem análise da documentação, uso de contas sem fiscalização nos municípios. Isso reforça que as calorosas discussões pelo Congresso das fontes de financiamentos da saúde passam longe do verdadeiro problema, estampado em documento público produzido pelo próprio governo federal.
Os exemplos estão por todo o país e serão mostrados ao longo desta semana. Para se ter uma idéia, em Acopiara, perdida no sertão do Ceará, foram investidos mais de R$ 10 milhões em apenas dois anos, em obras de abastecimento de água e construção de banheiros. Ainda assim, Francisco Alves, de 65 anos, precisa percorrer diariamente um quilômetro, sob sol, para buscar água para sobreviver. Lá, Joseane Ananias da Silva, de 25 anos, vive em extrema pobreza, com o marido e cinco filhos, que estão desnutridos.
Na comunidade de Serraria dos Garcias (CE) deveria existir água encanada. No lugar disso, só o esqueleto do projeto, abandonado há dois anos. O drama não é menor em Careiro da Varzéa, no Amazonas, onde a população precisa viajar uma hora e meia de barco para conseguir atendimento médico, em Manaus. Isso vale para um simples procedimento como um parto ou para conseguir um soro antiofídico para picada de cobra. O município não tem hospital, apesar dos 20 mil habitantes. Os médicos do Programa Saúde da Família só trabalham na parte da manhã.
Na região mais rica do país, o Sudeste, o drama persiste. Na pequena Jordânia, no Vale do Jequitinhonha, em Minas, recursos da ordem de R$ 1.233.018 não aliviaram o sofrimento da população. Em Paracambi, na Baixada Fluminense, equipamentos adquiridos com o dinheiro público estão encaixotados há pelo menos três anos e impedem o funcionamento de um hospital. O recurso da saúde tem destino certo determinado por lei, mas na prática, simples disputas políticas não permitem que a população seja beneficiada, como ocorre na cidade. O verde das vastas plantações do rico Norte do Paraná não é capaz de esconder a má aplicação do dinheiro público. No município 1º de Maio, a bóia-fria Maria Helena Soares, de 75 anos, hipertensa, tem de andar 15 minutos a pé para conseguir medir a pressão, procedimento que deve ser uma rotina semanal. Mesmo recebendo verba para manter equipe do posto de saúde, que conta com três carros, as visitas domiciliares estão suspensas no conjunto popular. Distante apenas 100km do Distrito Federal, os moradores de Abadiânia, em Goiás, convivem com o risco que representa o lixo espalhado pela cidade. O Ministério da Saúde repassou meio milhão de reais para construção de um aterro sanitário, erguido parcialmente e sem normas técnicas, que enterraram a esperança de dias melhores.
Maiores detalhes acessar:
http://stat.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20080824/fotos/a2-1.jpg
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Água encanada fica só na promessa dos políticos
A verba de R$ 1 milhão destinada a obras de abastecimento de Acopiara (CE) evaporou. A população sobrevive graças a um pequeno açude
Alana Rizzo
Do Estado de Minas

Fortaleza — Sob o sol escaldante do Ceará, moradores da zona rural de Acopiara, a 345km de Fortaleza, enfrentam todos os dias uma caminhada até o açude mais próximo para buscar água. As incontáveis promessas de que a água encanada chegaria à casa de cada morador continuam. Em ano de eleições, são reforçadas pelos candidatos à prefeitura.
Mas Natalino Walter da Silva, de 73 anos, já desistiu. “Não acredito mais”, comenta o morador do distrito de Carretão. Ele e a mulher, Maria Cecília Nogueira, de 70, moram há 44 anos na área e estão cansados das desculpas. “Primeiro, foi falta de verba. Depois, não pode porque é ano de eleição. Tem também a mudança no projeto, falta de espaço”, cita.
Em frente à casa dele estão 22 manilhas da obra de abastecimento de água que seria feita. Há pelo menos um ano, ele vê todos os dias o esqueleto da obra que iria facilitar sua vida e de outras 12 famílias da região. “Já que não vão terminar, podiam pelo menos tirar isso daí, que fica atrapalhando a passagem”, diz Maria Cecília.
A família, por conta própria, construiu um pequeno açude, que serve também aos vizinhos. “Vendi seis gados”, reclama Natalino. Em tempos de seca, o medo ronda a família. “Agora está mais tranqüilo por conta do açude, mas já sofremos muito. Ele colocava os jarros no jeguinho cedo e saía andando, onde encontrasse água trazia. Dormia rezando para chover, para encher os açudes”, recorda Cecília. A poucos metros dali, Josefina Cleide da Silva, de 44, carrega na cabeça a água para a família. É esste esforço que garante o banho e a comida dela, do marido, da sogra e da filha. Quando chega em casa, divide nos jarros a água. “Tem que economizar. Já me acostumei a ir buscar, mas seria muito melhor ter direto em casa”, sonha.
No lado oposto da cidade, no Bairro Serraria dos Garcias a obra foi feita pela metade. Há três meses, a caixa d’água começou a funcionar. O projeto previa a retirada da água de um açude, mas por enquanto usam a água de um velho poço. Só que ela é insalubre e não pode ser consumida. Os próximos meses preocupam os moradores, já que o poço seca no fim do ano. A disponibilidade da água também não é muita. “Eles ligam às 7h e por volta das 8h fecham o registro. Então, temos que colocar a água nos baldes e deixar guardada”. Seu marido, o aposentado Francisco Alves, de 65 anos, conta com a ajuda do jegue Pretinho na hora de buscar a água. A obra, segundo ele, não mudou nada sua rotina. “Continuo tendo que ir no açude.”
Construção
Todas essas obras fazem parte de um convênio milionário firmado entre a prefeitura e a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) para construção do sistema de abastecimento de água em sete bairros, assinado em dezembro de 2005. O valor do projeto é de R$ 1.052.776 e durante a fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU) nenhuma estava funcionando.
A CGU contesta a dispensa de licitação para a obra. A justificativa da prefeitura é emergência e calamidade pública. No entanto, apesar de a ordem de serviço ter sido emitida em 17 de maio de 2006, até hoje nem todos os sistemas implantados se encontram em funcionamento. De acordo com a Controladoria, para usar esse dispositivo legal a prefeitura deveria solucionar a situação emergencial em 180 dias.
O prefeito Antônio Almeida, candidato à reeleição, não foi encontrado pela reportagem para comentar o caso. Em ofício enviado à CGU, em 26 de setembro de 2007, ele diz que determinou ao secretário de Saúde que tomasse todas as providencias relacionadas à obra.

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