sábado, 27 de outubro de 2007

DOMINGO MEMORIOSO

Hoje, publicando a parte final da Autobiografia e reminiscências de Zé Macedo.

(José Macedo, 90 anos)
No dia 18 de setembro de 1949, data em que comemoramos as bodas de prata, deu-se o casamento de Giselda com Manoel Josino da Costa, funcionário do Banco do Brasil, atualmente fiscal de consumo, residente em Bauru no Estado de São Paulo. Em 17 de setembro de 1953, casou-se Evandro com Lenira Barbosa.
Se no decorrer de minha existência passei por dissabores e revezes, também passei por momentos de glória e satisfação. No dia 8 de dezembro de 1958, Juarez ordenava-se sacerdote, naquele ano registrava-se mais uma seca no Ceará e as coisas tornavam-se difíceis, eu queria então receber o neo sacerdote com festividades para celebrar sua primeira missa, não medi esforços nem poupei sacrifícios. Um dos maiores desejos do novo padre era que Soledade conseguisse 100 crianças para fazer a primeira comunhão, em época que não havia inverno era um tanto difícil, porém Dona Soledade não esmoreceu, arrabaldes da cidade e sítios vizinhos convidando a meninada e prometendo dar o enxoval aos que não pudessem comprar.
Eram decorridos 10 anos que a igreja de Ipaumirim não recebia limpeza, mandei limpar, finalmente tomei todas as providências para que no dia 21 de dezembro, data em que Juarez cantaria sua primeira missa, nada faltasse.
Como nossa casa fosse insuficiente para hospedar os parentes e amigos, arranjei mais duas casas.
Na data marcada, tudo estava pronto, comestíveis, bebidas, fotógrafo, cinegrafistas, etc. Dona Soledade mandou fazer 300 sacos de papel de seda nos quais colocou merenda que foram distribuídas com 300 crianças que comungaram naquele dia, convém notar que às seis horas da manhã foi servido aos neo comungantes um copo de leite. Posso dizer que foi uma das cerimônias mais belas que assisti em minha vida.
Durante a celebração da missa de Juarez que foi auxiliada ou assistida por nove padres, dava-se o casamento de duas irmãs ao mesmo tempo, Gesilda e Genilda, a primeira com Dr. Firton Achá, boliviano, e a segunda com Sr. Lester Dale Hedrick, americano.
O fotografo bateu 100 fotografias que as tenho colocada em álbum.
Foi, portanto excedida a minha expectativa, os meus sacrifícios não foram baldados (?). Quando naquela época eu aspirava o curso primário a meus filhos, hoje eu vejo que dos nove existentes, seis são portadores de diploma.
Recordando o tempo da minha existência até a data presente, vejo como é difícil o caminho da vida, quantos empecilhos encontramos.
Aqueles que casam e constituem família assumem perante as leis divinas e humanas um grande compromisso e, para desincumbir-se desta divina missão é necessário muita renúncia, muito desprendimento e sobretudo muita coragem.
Uma família constituída de nove filhos, cada um com uma natureza diferente, seria necessário que seus genitores tivessem grandes conhecimentos de psicologia a fim de dar-lhes o tratamento adequado, então se sente a grande dificuldade de educar por não ter estes conhecimentos.
O fotografo bateu 100 fotografias que as tenho colocada em álbum.
Foi, portanto excedida a minha expectativa, os meus sacrifícios não foram baldados (?). Quando naquela época eu aspirava o curso primário a meus filhos, hoje eu vejo que dos nove existentes, seis são portadores de diploma.
Recordando o tempo da minha existência até a data presente, vejo como é difícil o caminho da vida, quantos empecilhos encontramos.
Aqueles que casam e constituem família assumem perante as leis divinas e humanas um grande compromisso e, para desincumbir-se desta divina missão é necessário muita renúncia, muito desprendimento e sobretudo muita coragem.
Uma família constituída de nove filhos, cada um com uma natureza diferente, seria necessário que seus genitores tivessem grandes conhecimentos de psicologia a fim de dar-lhes o tratamento adequado, então se sente a grande dificuldade de educar por não ter estes conhecimentos.
Se errei, muitas vezes, na educação doméstica aos filhos foi porque não sabia acertar porém minha intenção era boa. Atualmente, vejo muitos pais de família modernos que criam os filhos deixando fazer tudo que entendem sem advertir-lhe em coisa alguma, pode ser que estejam certos, mas também pode ser que não estejam.
Reconheço que muitas ocasiões fui austero a fim de fazer valer minha autoridade para que os filhos chegassem a ser o que hoje são.
Graças a Deus não me envergonho e vejo que todos os meus filhos são atenciosos, honestos e delicados.
Ainda bem que, há pouco tempo, ouvi ser pronunciada pelo Padre Juarez as seguintes palavras: “o que seríamos de nós atualmente se o papai não nos tivesse criado da maneira que nos criou.”
No ano de 1942, chegava do município de Cedro, um rapazinho por nome de Vicente Gomes de Morais que vinha a Ipaumirim para colocar-se como feitor na estrada de rodagem. Um cunhado dele, por nome Raimundo Lemos, falou-me para empregá-lo como caixeiro em minha casa comercial, aceitei.
Inicialmente, o rapaz demonstrava pouca prática do ramo de tecido, porém via-se que era vontadoso e trabalhador. Marquei para ele um salário de cem cruzeiros mensais.
O tempo corria e cada dia que passava o rapaz ia desenvolvendo os seus conhecimentos, obedecia-me como se fosse um pai, zelava os meus interesses era honesto a toda prova.
Decorrido um certo tempo, Vicente não tinha mais ordenado marcado, retirava o necessário para suas despesas, no fim do ano quando dávamos balanço, eu dava-lhe uma gratificação.
No ano de 1960, meu genro, Manoel Josino, tendo sido transferido para São Paulo, como fiscal de consumo, resolvi comprar-lhe a casa de residência com os respectivos móveis e mudar-me para Fortaleza.
Diante dessa resolução, admiti Vicente como sócio e no ano de 1962, afastei-me do comércio, ficando ele como único dono. Posso acrescentar que meu antigo empregado foi um dos maiores amigos que tive em minha vida. Grandes incômodos do meu aparelho digestivo acompanhado de grandes dores trazia-me sempre mal humorado, Vicente sabia dissimular os meus aborrecimentos e estava sempre a frente dos negócios resolvendo tudo que estava a seu alcance. Posso afirmar que aquele rapaz muito contribuiu para ajudar na educação de meus filhos e aumentar meu patrimônio.
Neste pequeno opúsculo, faço um apelo aos meus filhos para serem amigos leais e dedicados de Vicente Gomes de Morais como pessoa de reconhecimento pelos bons serviços que me prestou.
Há quarenta anos, conhecia-se o sul do país pela geografia, bem pouca gente visitava aquelas longínquas paragens tão distante do Nordeste. A única via de transporte para chegar-se até lá era o navio. Durante o período de governo de Epitácio Pessoa é que o nordeste brasileiro começou a desenvolver as estradas de rodagem, o automóvel começou a penetrar no interior dos estados.
Outro grande presidente que tivemos, foi o Dr. Getúlio Vargas que governou o país por cerca de vinte anos tanto como ditador que galgou o poder mediante o triunfo da revolução de 1930 como por eleição em que prevaleceu o voto secreto, uma das leis criadas por ele durante o período discricionário. Mais tarde, foram surgindo os campos de aviação, tanto nas capitais como no interior dos estados, então o povo nordestino começou a movimentar-se, as distâncias foram encurtando.
Hoje, existe a grande aproximação entre sul e norte tanto pela via aérea como pela terrestre. Eu que jamais pensei em conhecer a capital do meu país, fiz-lhe a primeira visita em companhia de Dona Soledade no ano de 1956, em 1961 fomos novamente e chegamos até Bauru onde morava Josino, posso dizer que para nós foi um dos passeios mais agradáveis que empreendi em toda a minha vida.
Em Bauru, compareceram oito filhos e três genros inclusive Genilda que veio dos estados unidos. Josino, com a gentileza que lhe é peculiar, cumulou-nos de grande carinho e dedicação e ali festejamos em um ambiente da mais íntima cordialidade o Natal e o Ano Novo.
Depois de longa caminhada pela estrada da existência onde passei por longas travessias levado comigo as dúvidas e ilusões penetrei na verdadeira realidade e vi como é difícil esta trajetória na qual transpus grandes desfiladeiros se bem que tenha penetrado em vastas planícies e bosques verdejantes, cheguei ao ponto do destino e não tenho mais aspirações.
Minha maior satisfação é quando visito meus filhos ou por eles sou visitado, nos quais eu noto o carinho e desvelo com que tratam os seus velhos pais, alegro-me em receber suas cartas dando prova de seu amor filial.
Quero aqui fazer referência a uma longa missiva que recebi de Evandro em data de oito de setembro de 1962, naquelas seis páginas escritas em estilo amoroso, ele fazia um relato dos tempos da sua infância quando morávamos no Mane, referia-se aos pontos críticos de nossa vida, também não deixava de mencionar aspectos agradáveis onde conseguimos grandes vitórias e vimos ser concretizada grande parte do nosso ideal.
Esta carta que guardo com grande carinho sempre estou a mostrar a pessoas de nossa intimidade.
Uma das maiores satisfações de minha vida é ver a união que existe entre os nove filhos, verifico que eles se amam mutuamente. Certa ocasião, referindo-me sobre este assunto com o Evandro, recebi dele estas confortantes palavras: “Se somos assim é porque o senhor soube nos educar”.
Estas páginas que escrevo são dedicadas aos meus filhos e hoje vejo a minha existência descambando para o ocaso, dirijo-lhes um apelo para que se compreendendo mutuamente, auxiliando uns aos outros em caso de necessidade, e assim tornar-se-á uma família unida e forte.
Atualmente levo uma vida inativa dedicando-me a leitura de livros e jornais, o meu pensamento está sempre vagando; recordo os tempos da minha infância; vejo em minha memória o meu velho pai que lutou com tanto sacrifício para sustentar uma família numerosa; relembro os tempos do Mane quando eu ia trabalhar na roça com meus dois filhinhos pequenos de oito e nove anos limpando mato de mão, furando-as com os espinhos que pegavam.
Muitas vezes, eu meditando dizia a mim mesmo – sou um criminoso, constitui uma família e estou criando-a neste pé de serra, convivendo com caboclos ignorantes. Isto me acabrunhava porém nas minhas orações pedia sempre ao bom Deus para que me ajudasse e minhas preces foram ouvidas. Hoje, vejo meus filhos gozando de certa independência e fazendo parte da alta sociedade.
Conforme eu disse em capítulo anterior, o meu saudoso pai deixou-me de herança uma pequena caderneta caligrafada com um pouco de sua biografia e alguns conselhos para que observemos os preceitos da religião católica especificamente naquilo que se refere a maior das virtudes – a caridade, e eu reitero este pedido a meus filhos para serem mansos e humildes de coração e jamais deixem de socorrer os necessitados.
Este opúsculo foi escrito ao correr da pena, mesmo que eu fosse um letrado seria necessária uma revisão, portanto aqueles que lerem-no tem que perdoar os erros e borrões.
Se o meu repertório não fosse tão pobre daria para escrever centenas de páginas contando passagens de minha vida, por este motivo vou encerrar pedindo aos filhos que de mim tem alguma mágoa que me perdoem, pois se errei, conforme disse em capítulo anterior foi por não saber acertar.

Fortaleza, 23 de julho de 1964
José Macedo.
Sequencia de imagens utilizadas:
1. Foto de Zé Macedo, aos 90 anos
2. Cartão da loja na Coletoria Estadual de Ipaumirim
3. Igreja de ipaumirim, onde foi rezada a missa de que fala o texto.
4. Filho mais novo de Zé Macedo, Bosco e Célia (esposa)
5. Soledade Macedo, aos 90 anos

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