A entrevista legendária
“Visita ao rebelde cubano em seu refúgio”, assim intitulou o importante diário “The New York Times”, em sua edição de 24 de fevereiro de 1957, a primeira parte de uma reportagem que atraiu a atenção mundial, ao mostrar a guerrilha sobrevivente, liderada pelo comandante-em-chefe Fidel Castro na Serra Maestra • Fidel ordenou a Faustino Pérez, expedicionário do iate Granma, que descesse das montanhas à planície e que, entre as primeiras missões a cumprir, tentasse enviar um jornalista, mas os diretores das principais publicações se recusaram por medo das represálias. Contudo, nos primeiros dias de fevereiro, conseguiram que o destacado repórter Hebert Matthews, chegasse a Cuba...
(Extraído do livro em edição: Marabuzal)
POR JOSÉ ANTONIO FULGUEIRAS
Sierra Maestra
O caminho apareceu diante de Felipe Guerra Matos como uma corda lamacenta e enegrecida pela noite rural em Manzanillo. Felipe conhecia o caminho como a palma da mão e sabia muito bem onde estavam os cruzamentos da estrada como um reflexo condicionado pelas muitíssimas subidas e descidas. Seu jipe Willy assemelhava-se a um mulo de cascos firmes, domesticado para vencer os obstáculos que os aguaceiros dos últimos dias esculpiram no caminho rústico e estreito. A seu lado, mais ou menos acomodado no banco dianteiro, viajava o jornalista norte-americano Herbert Matthews, que segundo parece, tentava decifrar através do pára-brisa o caminho que o levaria a um lugar desconhecido na Serra Maestra.
“Creio que não vai chover nesta noite”, disse o motorista em voz alta, inclinando a cabeça para um lado. Depois reparou que o norte-americano sabia pouco ou nada de espanhol. René Rodríguez, Javier Pazos, Quique Escalona e Nardi Iglesias, que também viajavam no banco traseiro também nada responderam.
Então, com o pouco conhecimento que tinha do idioma inglês, tentou enfiar na mente alguma frase para ganhar a amizade do repórter do The New York Times, famoso por seu trabalho como repórter em diversos países do mundo, participando como testemunha de alguns dos acontecimentos mais importantes do século.
O homem, na casa dos 60 anos, foi correspondente de guerra na Abissínia, na década de 30, e na Espanha, durante a Guerra Civil, que acabou com a República. Publicou vários livros e ganhou diversos prêmios, entre os quais, o John Moors Cabot, conferido pela Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia.
Matthews era editor do The New York Times, e se destacava na redação de editoriais e reportagens especiais sobre a América Latina. Com mais de 1,80 m, magro, ligeiramente encorvado, olhos claros e olhar penetrante, Herbert Matthews, desde sua posição liberal, era considerado um dos jornalistas mais prestigiados e importantes nos Estados Unidos.
“Creio que não vai chover nesta noite”, disse o motorista em voz alta, inclinando a cabeça para um lado. Depois reparou que o norte-americano sabia pouco ou nada de espanhol. René Rodríguez, Javier Pazos, Quique Escalona e Nardi Iglesias, que também viajavam no banco traseiro também nada responderam.
Então, com o pouco conhecimento que tinha do idioma inglês, tentou enfiar na mente alguma frase para ganhar a amizade do repórter do The New York Times, famoso por seu trabalho como repórter em diversos países do mundo, participando como testemunha de alguns dos acontecimentos mais importantes do século.
O homem, na casa dos 60 anos, foi correspondente de guerra na Abissínia, na década de 30, e na Espanha, durante a Guerra Civil, que acabou com a República. Publicou vários livros e ganhou diversos prêmios, entre os quais, o John Moors Cabot, conferido pela Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia.
Matthews era editor do The New York Times, e se destacava na redação de editoriais e reportagens especiais sobre a América Latina. Com mais de 1,80 m, magro, ligeiramente encorvado, olhos claros e olhar penetrante, Herbert Matthews, desde sua posição liberal, era considerado um dos jornalistas mais prestigiados e importantes nos Estados Unidos.
Mister, how do you feel here?, Guerrita queria perguntar, mas essa pergunta pareceu-lhe vulgar para uma pessoa tão experiente na arte das perguntas e respostas.
Saindo de Yara, uma patrulha da estrada os detém. Um guarda, com cara amarrada, aproximou-se deles e Guerrita, sem descer do veículo, respondeu-lhe antes que o homem lhe perguntasse:
— O senhor é um norte-americano rico que está interessado em comprar os campos de arroz de Gómez, disse, enfatizando a palavra rico e o sobrenome do burguês, muito conhecido na zona.
A frase era quase uma redundância para o patrulheiro, pois segundo os jornais e os filmes da época, todos os norte-americanos eram ricos. No entanto, o guarda, satisfeito com as facilidades que sua farda amarela lhe proporcionava para beber uma cerveja sem pagar em qualquer bar de Manzanillo e seus arredores, sabia que incomodar uma pessoa abastada era fatal para suas aspirações de ser promovido para sargento, então, como diria o poeta Amado Nervo, fez um gesto de cortesia e fechando os olhos os deixou passar.
Para Guerra Matos, depois do ardil efetivo, o mais importante era dirigir o melhor possível por aquele caminho inundado por causa das chuvas recentes e chegar ao destino.
Are you cold?, perguntou-lhe o norte-americano quando o viu fazer um gesto de quem sente um momentâneo calofrio. Mas o homem continuou absorto na escuridão e no pensamento. De vez em vez, quando absorvia o cachimbo que não afastava da boca; depois expirava a fumaça pouco a pouco.
Para chegarem a Matthews, os companheiros do Movimento 26 de Julho tiveram que transitar inteligentemente um caminho perigoso. A idéia foi de Fidel Castro, que com 82 homens tinha desembarcado, dois meses antes (2 de dezembro de 1956) pela praia Las Coloradas, na costa norte da província de Oriente.
Após serem surpreendidos pelo exército batistiano em Alegria de Pío, os jovens rebeldes se dispersaram por diferentes lugares da zona. Alguns foram presos ou assassinados às ordens do presidente Fulgencio Batista; outros puderam burlar o cerco e somente sete conseguiram reencontrar-se em Cinco Palmas, onde Fidel, com uns poucos fuzis tornou célebre em 1956 a frase mais otimista do século 20: “Agora sim ganhamos a guerra”!
Saindo de Yara, uma patrulha da estrada os detém. Um guarda, com cara amarrada, aproximou-se deles e Guerrita, sem descer do veículo, respondeu-lhe antes que o homem lhe perguntasse:
— O senhor é um norte-americano rico que está interessado em comprar os campos de arroz de Gómez, disse, enfatizando a palavra rico e o sobrenome do burguês, muito conhecido na zona.
A frase era quase uma redundância para o patrulheiro, pois segundo os jornais e os filmes da época, todos os norte-americanos eram ricos. No entanto, o guarda, satisfeito com as facilidades que sua farda amarela lhe proporcionava para beber uma cerveja sem pagar em qualquer bar de Manzanillo e seus arredores, sabia que incomodar uma pessoa abastada era fatal para suas aspirações de ser promovido para sargento, então, como diria o poeta Amado Nervo, fez um gesto de cortesia e fechando os olhos os deixou passar.
Para Guerra Matos, depois do ardil efetivo, o mais importante era dirigir o melhor possível por aquele caminho inundado por causa das chuvas recentes e chegar ao destino.
Are you cold?, perguntou-lhe o norte-americano quando o viu fazer um gesto de quem sente um momentâneo calofrio. Mas o homem continuou absorto na escuridão e no pensamento. De vez em vez, quando absorvia o cachimbo que não afastava da boca; depois expirava a fumaça pouco a pouco.
Para chegarem a Matthews, os companheiros do Movimento 26 de Julho tiveram que transitar inteligentemente um caminho perigoso. A idéia foi de Fidel Castro, que com 82 homens tinha desembarcado, dois meses antes (2 de dezembro de 1956) pela praia Las Coloradas, na costa norte da província de Oriente.
Após serem surpreendidos pelo exército batistiano em Alegria de Pío, os jovens rebeldes se dispersaram por diferentes lugares da zona. Alguns foram presos ou assassinados às ordens do presidente Fulgencio Batista; outros puderam burlar o cerco e somente sete conseguiram reencontrar-se em Cinco Palmas, onde Fidel, com uns poucos fuzis tornou célebre em 1956 a frase mais otimista do século 20: “Agora sim ganhamos a guerra”!
Contudo, a imprensa cubana publicou a notícia de que Fidel foi morto e a guerrilha eliminada. E depois, censura total contra tudo o que e parecesse rebeldia.
Quando subia a montanha, Guerrita lembrou aquele fato:
“Entre os dias 9 e 11 de fevereiro de 1957, perdemos o contato com a Serra, até o dia em que o companheiro Radamés Reyes, telegrafista do quartel e aliado do Movimento 26 de Julho, chegou à loja de Rafael Sierra. Trazia a infeliz notícia de que Fidel e o grupo tinham sido liquidados numa emboscada em Los Altos de Espinosa.
“Rafael Sierra me informou e imediatamente transmiti a Celia aquela horrenda notícia. Com muito otimismo, ela disse: ‘Não acredito, pois a imprensa já o teria publicado. Temos que confirmá-lo, mas tenho certeza que ele estava vivo’.”
Quando subia a montanha, Guerrita lembrou aquele fato:
“Entre os dias 9 e 11 de fevereiro de 1957, perdemos o contato com a Serra, até o dia em que o companheiro Radamés Reyes, telegrafista do quartel e aliado do Movimento 26 de Julho, chegou à loja de Rafael Sierra. Trazia a infeliz notícia de que Fidel e o grupo tinham sido liquidados numa emboscada em Los Altos de Espinosa.
“Rafael Sierra me informou e imediatamente transmiti a Celia aquela horrenda notícia. Com muito otimismo, ela disse: ‘Não acredito, pois a imprensa já o teria publicado. Temos que confirmá-lo, mas tenho certeza que ele estava vivo’.”
FIDEL ESTÁ VIVO!
“Eu propus a Crespo que o melhor era que ele abandonasse a Serra e respondeu taxativamente: ‘Enquanto houver um fuzil aqui, a luta continuará’. Senti grande admiração pela atitude daquele homem semi-analfabeto, que em meio do desespero, mostrava os valores e a qualidade humana dos expedicionários do Granma.
“No dia seguinte, Miguelito retornou de novo a Manzanillo com a confirmação de que Fidel estava vivo e mandou um mensageiro, que esperava por nós na quinta de Epifanio para recolhê-lo, porque recebeu a ordem de se entrevistar com Celia. Fui buscá-lo e quando regressávamos, deparei na entrada de Manzanillo com um soldado da guarda rural que me pediu carona. Parei o carro e o levei. Entrei na cidade protegido por um guarda inimigo e festejando a vida de Fidel”.
Mas a ditadura de Batista se aferrava à notícia de que Fidel e seus homens tinham sido liquidados. Foi por isso que Fidel pediu um repórter, para que publicasse a notícia, mas os chefes da imprensa nacional tinham medo das represálias e por isso foi necessário buscar um jornalista de um jornal influente.
Ruby Hart Phillips, correspondente do The New York Times em Havana, mandou Matthews vir urgentemente para Cuba, pois tinha uma boa notícia para ele. Na segunda-feira, 4 de fevereiro, a senhora Phillips foi convocada para o escritório de Felipe Pazos, no prédio Bacardí, na rua Monserrate. Ali se encontravam também seu filho Javier Faustino Pérez e René Rodríguez, que explicaram à repórter o interesse de Fidel em receber um jornalista no coração da Serra Maestra.
Logicamente, Phillips se ofereceu de imediato, mas foi convencida de que não devia ser ela, pois as condições da viagem eram muito difíceis para uma mulher, e além disso, ela era a correspondente permanente no país e depois podia ser alvo de uma forte represália do regime de Batista.
No telefonema de Phillips e Matthews não se deram muitos detalhes, mas um jornalista experiente como ele sabia que se tratava de algo muito importante.
Mas a ditadura de Batista se aferrava à notícia de que Fidel e seus homens tinham sido liquidados. Foi por isso que Fidel pediu um repórter, para que publicasse a notícia, mas os chefes da imprensa nacional tinham medo das represálias e por isso foi necessário buscar um jornalista de um jornal influente.
Ruby Hart Phillips, correspondente do The New York Times em Havana, mandou Matthews vir urgentemente para Cuba, pois tinha uma boa notícia para ele. Na segunda-feira, 4 de fevereiro, a senhora Phillips foi convocada para o escritório de Felipe Pazos, no prédio Bacardí, na rua Monserrate. Ali se encontravam também seu filho Javier Faustino Pérez e René Rodríguez, que explicaram à repórter o interesse de Fidel em receber um jornalista no coração da Serra Maestra.
Logicamente, Phillips se ofereceu de imediato, mas foi convencida de que não devia ser ela, pois as condições da viagem eram muito difíceis para uma mulher, e além disso, ela era a correspondente permanente no país e depois podia ser alvo de uma forte represália do regime de Batista.
No telefonema de Phillips e Matthews não se deram muitos detalhes, mas um jornalista experiente como ele sabia que se tratava de algo muito importante.
Fidel, Raul e Che Guevara
Cinco dias depois, Matthews, acompanhado de sua esposa Nancie, chegou à terra cubana. Em 15 de fevereiro, às 22h, hospedou-se no hotel Sevilla, com sua mulher, e se encaminhou para o oriente do país, com Faustino Pérez, que desde o primeiro momento trabalhou incansavelmente para executar a ordem que Fidel lhe tinha dado.
Faustino acompanhou o destacado jornalista até Manzanillo. Guerrita viu pela primeira vez o jornalista nessa cidade, em casa de Pedro Eduardo Saumell, e pensou que era um homem muito idoso para viajar pelo caminho difícil que o levaria à Serra. E por seu cachimbo e boné, segundo ele, parecia-se mais com um detetive privado ao estilo de Sherlock Holmes do que com um repórter com vigor e juventude para escalar, por exemplo, a Colina de la Derecha de Caracas, que se ergue majestosa, vestida com a verde folhagem da Serra.
Matthews e Nancie estavam cansados pela longa viagem, quase sem dormir, por toda a Rodovia Central. Somente detiveram-se em Camagüey para tomar o café da manhã. Depois continuaram rumo a Bayamo e entraram no trecho mais difícil, custodiado por várias patrulhas do exército. Seus visíveis traços de turistas estrangeiros lhe permitiram entrar em Manzanillo sem muitos contratempos, acompanhados por Faustino Pérez, Javier Pazos e Lilia Mesa.
À medida que a encosta e a água estagnada exigiam maior velocidade do motor do jipe, Guerrita olhava de esguelha o norte-americano, que tinha deixado sua esposa na casa do anfitrião, Saumell, em Manzanillo. Ele estava concentrado na direção do jipe, nas velocidades e no freio, evitando os saltos e as freadas abruptas. Contudo, de vez em vez, quando o jipe dava um grande salto como um cavalo ferido pelo ginete. Sempre que isso acontecia, Guerrita olhava para o rosto do norte-americano, tentando ver algum gesto de contrariedade, mas o homem aceitava sem alarde os saltos do jipe por causa do caminho alagado.
Esta era a terceira viagem no mesmo dia à quinta de Epifanio Díaz, camponês, de amizade sincera e um dos primeiros colaboradores de Fidel e da guerrilha depois do desembarque.
Faustino acompanhou o destacado jornalista até Manzanillo. Guerrita viu pela primeira vez o jornalista nessa cidade, em casa de Pedro Eduardo Saumell, e pensou que era um homem muito idoso para viajar pelo caminho difícil que o levaria à Serra. E por seu cachimbo e boné, segundo ele, parecia-se mais com um detetive privado ao estilo de Sherlock Holmes do que com um repórter com vigor e juventude para escalar, por exemplo, a Colina de la Derecha de Caracas, que se ergue majestosa, vestida com a verde folhagem da Serra.
Matthews e Nancie estavam cansados pela longa viagem, quase sem dormir, por toda a Rodovia Central. Somente detiveram-se em Camagüey para tomar o café da manhã. Depois continuaram rumo a Bayamo e entraram no trecho mais difícil, custodiado por várias patrulhas do exército. Seus visíveis traços de turistas estrangeiros lhe permitiram entrar em Manzanillo sem muitos contratempos, acompanhados por Faustino Pérez, Javier Pazos e Lilia Mesa.
À medida que a encosta e a água estagnada exigiam maior velocidade do motor do jipe, Guerrita olhava de esguelha o norte-americano, que tinha deixado sua esposa na casa do anfitrião, Saumell, em Manzanillo. Ele estava concentrado na direção do jipe, nas velocidades e no freio, evitando os saltos e as freadas abruptas. Contudo, de vez em vez, quando o jipe dava um grande salto como um cavalo ferido pelo ginete. Sempre que isso acontecia, Guerrita olhava para o rosto do norte-americano, tentando ver algum gesto de contrariedade, mas o homem aceitava sem alarde os saltos do jipe por causa do caminho alagado.
Esta era a terceira viagem no mesmo dia à quinta de Epifanio Díaz, camponês, de amizade sincera e um dos primeiros colaboradores de Fidel e da guerrilha depois do desembarque.
FAUSTINO O LEVOU A MANZANILLO E ALMEIDA FOI O PRIMEIRO A RECEBÊ-LO NA SERRA
A casa do velho Epifanio erguia-se solidária em Los Chorros, a sul do Purial de Jibacoa, na vertente norte da Serra Maestra. Na quinta não havia grandes elevações que possibilitassem o refúgio da guerrilha, embora pelo lugar em que se encontrava, facilitasse o acesso de qualquer veículo ou pessoa que não conhecia o caminho.
Fidel, que conhecia a lealdade e colaboração de Epifanio e de seus dois filhos, Enrique e Miguel, decidiu esperar nesse lugar o jornalista norte-americano e ao mesmo tempo realizar a primeira reunião com os principais dirigentes da planície oriental.
Filho de camponeses, e camponês ele também, Guerrita podia determinar as horas apenas olhando os astros. Por tal motivo, quando viu a lua no centro do céu, soube que, no domingo, 17 de fevereiro de 1957, quase estava terminando.
Foi então que deteve o veículo e disse que havia que continuar a pé. Matthews desceu do jipe e caminhou com os outro em meio da escuridão e do cício do grilo insone. Guerra Matos, conhecedor do caminho, ia à frente e o jornalista se guiava por seus passos, sem soltar o cachimbo nem as ânsias de chegar.
De repente apareceu diante deles o riacho Tío Lucas, que corria entre as árvores da Serra. Para chegar ao acampamento, era preciso atravessar o riacho de águas frias e as correntezas. René o explicou ao repórter do The New York Times e este respondeu com um gesto animador.
Matthews entrou brioso, mas em meio do riacho perdeu o equilíbrio e caiu na água. “Danou-se o norte-americano”! gritou Guerrita. Mas, apesar do surpreendente esbarrão, o jornalista levantou a pequena carteira que levava nas mãos, sem soltar o cachimbo da boca. Guerrita ofereceu-lhe a mão em sinal de ajuda e o norte-americano se incorporou com certos brios juvenis.
O riacho da Serra, que comprazia a Martí mais que o mar, se comporta como um cachorro faminto que lambe constantemente as pedras do fundo até deixá-las polidas. Matthews, ao que parece, não levou em conta o curso fluvial, e esbarrou como um clássico jogador de beisebol à procura da base.
Contudo, não perdeu a postura nem a inteireza, e com gesto elegante, exortou a prosseguir a viagem rumo ao acampamento, que, sem ele saber, apenas faltava uns poucos minutos.
O primeiro a recebê-lo foi o expedicionário Juan Almeida Bosque, que lhe explicou que Fidel se encontrava nesse momento no Estado-Maior e que chegaria ao amanhecer. Matthews simpatizou, desde o primeiro momento, com este homem que apoiava suas palavras na tradução de Pazos e lhe informou que a tropa dispunha de vários acampamentos.
Filho de camponeses, e camponês ele também, Guerrita podia determinar as horas apenas olhando os astros. Por tal motivo, quando viu a lua no centro do céu, soube que, no domingo, 17 de fevereiro de 1957, quase estava terminando.
Foi então que deteve o veículo e disse que havia que continuar a pé. Matthews desceu do jipe e caminhou com os outro em meio da escuridão e do cício do grilo insone. Guerra Matos, conhecedor do caminho, ia à frente e o jornalista se guiava por seus passos, sem soltar o cachimbo nem as ânsias de chegar.
De repente apareceu diante deles o riacho Tío Lucas, que corria entre as árvores da Serra. Para chegar ao acampamento, era preciso atravessar o riacho de águas frias e as correntezas. René o explicou ao repórter do The New York Times e este respondeu com um gesto animador.
Matthews entrou brioso, mas em meio do riacho perdeu o equilíbrio e caiu na água. “Danou-se o norte-americano”! gritou Guerrita. Mas, apesar do surpreendente esbarrão, o jornalista levantou a pequena carteira que levava nas mãos, sem soltar o cachimbo da boca. Guerrita ofereceu-lhe a mão em sinal de ajuda e o norte-americano se incorporou com certos brios juvenis.
O riacho da Serra, que comprazia a Martí mais que o mar, se comporta como um cachorro faminto que lambe constantemente as pedras do fundo até deixá-las polidas. Matthews, ao que parece, não levou em conta o curso fluvial, e esbarrou como um clássico jogador de beisebol à procura da base.
Contudo, não perdeu a postura nem a inteireza, e com gesto elegante, exortou a prosseguir a viagem rumo ao acampamento, que, sem ele saber, apenas faltava uns poucos minutos.
O primeiro a recebê-lo foi o expedicionário Juan Almeida Bosque, que lhe explicou que Fidel se encontrava nesse momento no Estado-Maior e que chegaria ao amanhecer. Matthews simpatizou, desde o primeiro momento, com este homem que apoiava suas palavras na tradução de Pazos e lhe informou que a tropa dispunha de vários acampamentos.
Guerrilheiros en Sierra Maestra
A conversa demorou vários minutos, incorporando-se depois Ciro Frías e outros guerrilheiros. Almeida pediu a Matthews que descansasse um pouco. O norte-americano concordou e tirou do bolso uma caixa de fósforos, que sobreviveu do mergulho da madrugada e acendeu o cachimbo imutável.
Celia Sánchez lembrava:
Naquela noite, fomos caminhar para ver se encontrávamos uma pequena casa que víamos de dia. Íamos Fidel, Armando, Frank, Vilma e eu; e Luis Crespo que sempre estava perdido, e foi como guia. Não encontramos a casa; caminhamos tanto pela noite, que depois não soubemos voltar ao acampamento; deitamo-nos em pleno campo. Nessa madrugada chegou Matthews. Quando Universo chegou com a notícia, ordenamos-lhe que dissesse que Fidel estava em outro acampamento, que o esperasse ali. Almeida, Che e Raúl ficaram com o visitante.
No alvorecer, chegou ao acampamento o grupo liderado por Fidel. Vilma Espín, prestigiosa combatente da clandestinidade em Santiago de Cuba, que foi levada horas antes por Guerrita para o acampamento, e Javier Pazos, foram os tradutores, apesar de Fidel ter bom domínio do idioma inglês.
Raúl se adiantou ao grupo e cumprimentou o jornalista, anunciando a chegada de Fidel. Em seu diário de campanha, o então capitão Raúl Castro narrou o fato da maneira seguinte:
Chegamos ali e dei um abraço no “Flaco” (O Magro) — René Rodríguez —, que cumpriu realmente o que prometeu. Cumprimentei o jornalista e lembrando meu inglês elementar, lhe disse: How are you? Não entendi o que me respondeu e imediatamente chegou F (Fidel), que depois de cumprimentá-lo, sentou-se com ele na cabana e começou a entrevista, que, com certeza, será uma bomba (...) Enquanto corria a entrevista, o oficial Almeida triplicou a vigilância, tomando todas as medidas de segurança ao nosso alcance naquele lugar. Infelizmente esta é uma zona completamente a céu aberto e foi um atrevimento afastarmo-nos tanto de nossos queridos arvoredos. Se nos surpreendiam por causa de uma delação, o Movimento 26 de Julho sofreria um colapso, pois poderíamos perder alguns de nossos valentes homens.
Guerra Matos, por seu lado, o descreveu assim:
“Vi Fidel chegar e cumprimentar o jornalista, e senti uma imensa satisfação, mas não a externei. Tinha contribuído com um grãozinho de areia para este encontro tão esperado por nosso máximo líder, que tinha uma grande importância, pois tornaria público ao mundo que Fidel estava vivo e a guerrilha pronta para o combate. Em todo o percurso, fiz todo o possível para que o norte-americano se sentisse o mais cômodo e seguro possível, pois se ele se arrependesse no último instante, isso marcaria minha vida para sempre.
“Quando escorregou no riacho, fiquei desapontado e não consegui fazer coisa alguma para impedi-lo. Mas o jornalista tinha muita determinação como nós para chegarmos ao acampamento e nenhum bombardeio nos deteria. Percebi o entusiasmo de Fidel quando se dirigia a Matthews e esse regozijo o transmiti a meu coração.
Fidel cumprimentou Matthews com cortesia e singeleza. Com muita naturalidade, sentou-se em frente do repórte do The New York Times e começou a entrevista.
Matthews, como jornalista experiente, havia pesquisado durante sua estada em Havana sobre a situação em Cuba, a repressão a que era submetido o povo e conhecia, também, muitos traços pessoais de Fidel e alguns dados de sua história revolucionária estudantil e sua participação, como líder, no ataque ao quartel Moncada, em Santiago de Cuba.
Apesar disso, ficou impressionado com a juventude de Fidel, mas, à medida que o ouvia, chegava à conclusão de que o chefe guerrilheiro era um homem invencível.
Fidel contou-lhe a odisséia do desembarque, quando foram apreendidos e assassinados muitos expedicionários, mas a tropa conseguiu reagrupar-se, consolidar-se e desferir-lhe nos dois meses de levantamento, várias derrotas ao exército de Batista.
“Há setenta e nove dias que estamos lutando — expressou Fidel — e somos mais fortes do que nunca. Os soldados estão combatendo mal. Sua moral é baixa e a nossa não pode estar mais alta. Provocamos muitas baixas a eles, mas quando os prendemos, nunca os fuzilamos. Interrogamo-los, tratamo-los bem, ficamos com suas armas e seus equipamentos, e os libertamos.”
E mais para frente, acrescentou:
“O povo cubano ouve pela rádio todas as notícias referentes à Argélia, mas não ouve nem lê uma só palavra a respeito de nós, graças à censura. O senhor será o primeiro a falar-lhe de nós. Temos seguidores na Ilha inteira. Os melhores elementos, especialmente os jovens, são a nosso favor. O povo cubano é capaz de suportar qualquer coisa, menos a opressão.”
Fidel destacou ao jornalista que a ditadura estava empregando contra o povo armas munidas pelos EUA e acrescentou:
“Batista tem 3 mil homens com armas perseguindo-nos. Eu não lhe direi quantos homens tenho, por razões óbvias. O exército opera em colunas de 200 homens. Nós, em grupos de 10 a 40. É uma batalha contra o tempo, e o tempo está ao nosso favor.
Enquanto decorria a entrevista, René Rodríguez, com uma máquina fotográfica antiga que trouxe de Manzanillo, se graduava como correspondente de guerra. Com muito afã, focalizava o entrevistado e o entrevistador e apertava o obturador, enquanto Matthews, com traços ágeis e pouco legíveis, fazia apontamentos num caderno com capa preta.
Celia Sánchez lembrava:
Naquela noite, fomos caminhar para ver se encontrávamos uma pequena casa que víamos de dia. Íamos Fidel, Armando, Frank, Vilma e eu; e Luis Crespo que sempre estava perdido, e foi como guia. Não encontramos a casa; caminhamos tanto pela noite, que depois não soubemos voltar ao acampamento; deitamo-nos em pleno campo. Nessa madrugada chegou Matthews. Quando Universo chegou com a notícia, ordenamos-lhe que dissesse que Fidel estava em outro acampamento, que o esperasse ali. Almeida, Che e Raúl ficaram com o visitante.
No alvorecer, chegou ao acampamento o grupo liderado por Fidel. Vilma Espín, prestigiosa combatente da clandestinidade em Santiago de Cuba, que foi levada horas antes por Guerrita para o acampamento, e Javier Pazos, foram os tradutores, apesar de Fidel ter bom domínio do idioma inglês.
Raúl se adiantou ao grupo e cumprimentou o jornalista, anunciando a chegada de Fidel. Em seu diário de campanha, o então capitão Raúl Castro narrou o fato da maneira seguinte:
Chegamos ali e dei um abraço no “Flaco” (O Magro) — René Rodríguez —, que cumpriu realmente o que prometeu. Cumprimentei o jornalista e lembrando meu inglês elementar, lhe disse: How are you? Não entendi o que me respondeu e imediatamente chegou F (Fidel), que depois de cumprimentá-lo, sentou-se com ele na cabana e começou a entrevista, que, com certeza, será uma bomba (...) Enquanto corria a entrevista, o oficial Almeida triplicou a vigilância, tomando todas as medidas de segurança ao nosso alcance naquele lugar. Infelizmente esta é uma zona completamente a céu aberto e foi um atrevimento afastarmo-nos tanto de nossos queridos arvoredos. Se nos surpreendiam por causa de uma delação, o Movimento 26 de Julho sofreria um colapso, pois poderíamos perder alguns de nossos valentes homens.
Guerra Matos, por seu lado, o descreveu assim:
“Vi Fidel chegar e cumprimentar o jornalista, e senti uma imensa satisfação, mas não a externei. Tinha contribuído com um grãozinho de areia para este encontro tão esperado por nosso máximo líder, que tinha uma grande importância, pois tornaria público ao mundo que Fidel estava vivo e a guerrilha pronta para o combate. Em todo o percurso, fiz todo o possível para que o norte-americano se sentisse o mais cômodo e seguro possível, pois se ele se arrependesse no último instante, isso marcaria minha vida para sempre.
“Quando escorregou no riacho, fiquei desapontado e não consegui fazer coisa alguma para impedi-lo. Mas o jornalista tinha muita determinação como nós para chegarmos ao acampamento e nenhum bombardeio nos deteria. Percebi o entusiasmo de Fidel quando se dirigia a Matthews e esse regozijo o transmiti a meu coração.
Fidel cumprimentou Matthews com cortesia e singeleza. Com muita naturalidade, sentou-se em frente do repórte do The New York Times e começou a entrevista.
Matthews, como jornalista experiente, havia pesquisado durante sua estada em Havana sobre a situação em Cuba, a repressão a que era submetido o povo e conhecia, também, muitos traços pessoais de Fidel e alguns dados de sua história revolucionária estudantil e sua participação, como líder, no ataque ao quartel Moncada, em Santiago de Cuba.
Apesar disso, ficou impressionado com a juventude de Fidel, mas, à medida que o ouvia, chegava à conclusão de que o chefe guerrilheiro era um homem invencível.
Fidel contou-lhe a odisséia do desembarque, quando foram apreendidos e assassinados muitos expedicionários, mas a tropa conseguiu reagrupar-se, consolidar-se e desferir-lhe nos dois meses de levantamento, várias derrotas ao exército de Batista.
“Há setenta e nove dias que estamos lutando — expressou Fidel — e somos mais fortes do que nunca. Os soldados estão combatendo mal. Sua moral é baixa e a nossa não pode estar mais alta. Provocamos muitas baixas a eles, mas quando os prendemos, nunca os fuzilamos. Interrogamo-los, tratamo-los bem, ficamos com suas armas e seus equipamentos, e os libertamos.”
E mais para frente, acrescentou:
“O povo cubano ouve pela rádio todas as notícias referentes à Argélia, mas não ouve nem lê uma só palavra a respeito de nós, graças à censura. O senhor será o primeiro a falar-lhe de nós. Temos seguidores na Ilha inteira. Os melhores elementos, especialmente os jovens, são a nosso favor. O povo cubano é capaz de suportar qualquer coisa, menos a opressão.”
Fidel destacou ao jornalista que a ditadura estava empregando contra o povo armas munidas pelos EUA e acrescentou:
“Batista tem 3 mil homens com armas perseguindo-nos. Eu não lhe direi quantos homens tenho, por razões óbvias. O exército opera em colunas de 200 homens. Nós, em grupos de 10 a 40. É uma batalha contra o tempo, e o tempo está ao nosso favor.
Enquanto decorria a entrevista, René Rodríguez, com uma máquina fotográfica antiga que trouxe de Manzanillo, se graduava como correspondente de guerra. Com muito afã, focalizava o entrevistado e o entrevistador e apertava o obturador, enquanto Matthews, com traços ágeis e pouco legíveis, fazia apontamentos num caderno com capa preta.
Fidel (1959)
Fidel discursando para a multidão
INTERCEPTADOS NOVAMENTE POR UMA PATRULHA DO EXÉRCITO
Guerrita contou:
“Depois da entrevista, mandaram-nos passar para cumprimentar Fidel. O comandante-em-chefe mostrou interesse em saber como foi a viagem do repórter, qual caminho tomaram, quais medidas de precaução foram tomadas e insistiu em que tinha que ser mais cauteloso ao voltar, a fim de impedir que acontecesse alguma coisa ao jornalista.
“Recordei a Fidel que o conheci dez anos atrás, quando dos fatos da campanha de La Demajagua.” Guerrita revelou que o Fidel da Serra Maestra era o mesmo homem convicto e convincente, porém ainda mais inspirado. Gesticulava e punha otimismo em cada uma de suas palavras, que eram capazes de alentar a pessoa mais desanimada.
“Fui para Cayo Espino, para a quinta de meu pai a fim de buscar o carro que ali estava. Voltei e recolhi o norte-americano na casa de Epifanio e às 13h estávamos já em Cayo Espino.
“Sirva o almoço ao jornalista e que ele goste muito. O norte-americano tem que sair daqui com barriga cheia e coração contente’, disse Guerrita com tom de brincadeira a sua mãe e seu pai, camponeses admiradores e colaboradores das forças do Movimento 26 de Julho.”
Enquanto a família de Guerra Matos aprimorava a refeição cubana típica para satisfazer o visitante, o repórter apenas mastigou um pedacinho de frango e, com a maior cortesia do mundo, proferiu, para supresa de todos, cinco palavras que fizeram mudar completamente o itinerário:
Please, take me to Manzanillo. (Por favor, me leva a Manzanillo).
Guerrita não percebeu nesse momento que o pensamento do jornalista estava muito longe de seu estômago, e sua maior fome se concentrava na notícia que tinha gravada em sua cabeça e nos papéis que guardava zelosamente nos bolsos da camisa.
Uma patrulha do exército interceptou-os novamente na rodovia, mas Guerrita conseguiu desinformá-los outra vez. Ao redor das 17h, chegaram à casa de Saumell, onde sua esposa Nancie o esperava sentada na sala.
No limiar da porta, com breves palavras, Matthews propôs a Nancie partir imediatamente para Santiago de Cuba. Subiram apressados no carro que os levaria para o lugar. Viajaram de Santiago de Cuba para Havana num avião e no dia seguinte, o casal de norte-americanos foi para Nova Iorque.
Ao embarcar no avião, Nancie parecia mais gordinha que ao chegar. Será que teria abandonado seu regime, por causa da atraente comida cubana? Nada está mais longe disso. A esperta mulher havia colocado sob a roupa os papéis com todos os apontamentos que fez Matthews de sua entrevista histórica com Fidel. Enganaram, com discreta artimanha, os inspetores da alfândega e a rede dos ferozes membros do Sistema de Inteligência Militar de Batista.
Guerrita, por sua parte, continuou cumprindo suas tarefas, ora como mensageiro ora no translado de combatentes para a Serra Maestra. No mesmo dia em que Matthews abandonou Manzanillo, ele se encarregou de levar para a quinta de Epifanio Díaz mais três expedicionários do iate Granma, dispersos durante o desembarque.
Dias depois da partida do repórter para os Estados Unidos, Guerrita examinava diariamente os jornais à espera de um artigo escrito por Matthews. E no domingo, 24 de fevereiro de 1957, reparou que nas manchetes do El Diario de la Marina apareceu este título de grande impacto:
Fidel Castro
O IMPACTO DAQUELA ENTREVISTA FOI IMPRESSIONANTE
Fidel está vivo!
E mais abaixo, o seguinte sumário:
Entrevistado por Matthews, do “The New York Times”, na Serra. “Rebelde cubano é visitado em seu esconderijo”, aparecia depois na cabeça da página. E depois, a foto do chefe guerrilheiro com um fuzil de mira telescópica e a cópia fotostática do autógrafo que Fidel assinou na agenda do jornalista.
Guerrita, sentado no volante de seu jipe, começou a ler minuciosamente o artigo escrito por Matthews no The New York Times, que foi reinserido pelo El Diario de la Marina em suas páginas.
Matthews começava sua reportagem com esta afirmação:
“Fidel Castro, o chefe da juventude cubana, está vivo e está combatendo fortemente e com sucesso nos inóspitos e quase impenetráveis bosques da Serra Maestra, no extremo sul da Ilha.
“O presidente Fulgencio Batista mantém seu exército nessa região, mas os militares estão travando uma batalha, até agora, perdida para destruir o inimigo mais perigoso, ao qual o general Batista teve que enfrentar em sua longa e difícil carreira como líder e ditador cubano.
“Esta é a primeira notícia certa de que Fidel Castro ainda está vivo e em Cuba. Ninguém relacionado com o mundo exterior, e ainda menos com a imprensa, viu o senhor Castro, exceto este repórter. Ninguém em Havana, inclusive na Embaixada dos Estados Unidos, com todos seus recursos para a recopilação de informação, saberá até ser publicado este artigo que Fidel Castro está realmente na Serra Maestra.”
Matthews não escondeu neste artigo sua repulsa pelo regime de Fulgencio Batista e manifestou categoricamente: “Fidel Castro e seu Movimento 26 de Julho são o símbolo inflamado da oposição ao regime”.
Mais adiante argumentou: “Para facilitar meu acesso à Serra Maestra e meu encontro com Fidel Castro, dezenas de homens e mulheres em Havana e na província de Oriente correram verdadeiramente um grande perigo”.
Guerrita pensou que aquele homem de bonê e cachimba estava referindo-se a ele, e que em nenhum momento transpareceu que sabia do grande perigo que corriam ao levá-lo para se encontrar com Fidel. Por isso, quando releu a linha: “um grande perigo”, cresceu sua admiração pelo repórter veterano.
Continuou lendo e deparou que Matthews fazia um esboço biográfico de Fidel desde o ataque ao quartel Moncada até a expedição do iate Granma. Depois, referiu-se às diversas versões em torno da provável morte de Fidel, que desmentiu taxativamente. A seguir, informou de sua entrevista com Fidel e concluiu com uma breve referência a sua saída para Nova Iorque.
Dias depois, Guerrita deleitou-se novamente com mais dois artigos de Matthews, em que examinava a situação atual de Cuba.
O governo de Batista não teve outra alternativa que suspender a censura da imprensa. Ao que parece, tinha reconsiderado isso a partir da publicação dos artigos de Matthews, uma vez que estes poderiam ser aproveitados pela imprensa internacional para causar um grande escândalo e pôr em ridículo seu regime.
Por isso, os principais órgãos de imprensa de Cuba reproduziram os artigos de Matthews, ao passo que o ministro da Defesa, Santiago Verdeja, emitia algumas declarações em que qualificava as notícias de Matthews como os capítulos de um romance fantástico.
“O senhor Matthews não se entrevistou com o tal insurgente”, ressaltava.
O porta-voz governista impugnava a autenticidade da foto de Fidel e fundamentava sua dúvida com estas palavras:
“Parece ingênuo que, apesar de ter tido a oportunidade de se embrenhar naquelas montanhas e ter realizado a entrevista, não se retratasse com ele para confirmá-lo.”
Guerrita sabia que René lhe tinha tirado algumas fotos a Matthews e a Fidel quando conversavam na Serra Maestra. Talvez, pensou, os negativos se tivessem arruinado ou não tivessem a melhor qualidade para serem visíveis nas páginas de um jornal. Lembrou que Frank subiu também com uma máquina fotográfica, mas não se lembra dele tirando fotografias.
O regime batistiano tentava por todos os meios negar a veracidade da entrevista de Matthews com Fidel, a qual se espalhava por toda a Ilha. Aos depoimentos de Verdeja somaram-se os do chefe militar da província de Oriente, Martín Díaz Tamayo, que declarou à imprensa cubana: “É absolutamente impossível cruzar as linhas onde há tropas. A entrevista é história”.
Em 28 de fevereiro, como um facão no pescoço dos sicários de Batista, El Diario de la Marina mostrava, tirada do The New York Times, na capa a foto esperada em que apareciam Matthews e Fidel dialogando. A foto instantânea, que à velocidade da luz percorreu o mundo, mostrava à esquerda o repórter fazendo apontamentos. À direita, de perfil, o comandante-em-chefe Fidel Castro, com seu boné verde-olivo e sua barba de guerrilheiro, acendendo um charuto cubano, cujas chamas aclaravam as pupilas esperançosas das camadas mais humildes do povo.
Guerrita matos tirou seus óculos e enxugou-os com a ponta da camisa. Depois, pô-los novamente para poder apreciar com mais nitidez a foto tirada por seu companheiro René Rodríguez. Então mostrou um leve sorriso, arrancou o carro e partiu às pressas para a Serra Maestra.http://granmai.cubasi.cu/portugues/2007/febrero/mar20/8mattews-p.html
"No terán Cuba jamás!"
Fidel Castro Ruz
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José Martí (1883-1895)
De onde cresce a palma
1853 janeiro, 28. Nasce em Havana, à Calle de Paula N.° 41, José Martí; filho de Mariano Martí, de Valencia, e de Leonor Pérez, de Santa Cruz de Tenerife.
1857 Martí viaja com seus pais à Espanha.
1859 Regresso de Martí a Cuba.
1866 Início dos estudos de Segundo Grau, depois de ter estudado com o poeta Rafael María de Mendive.
1869 Martí publica seus primeiros escritos independentistas no jornal El Diablo Cojuelo, de seu amigo, Fermín Valdés. Faz o primeiro e único número de seu jornal La Patria Livre, onde aparece seu drama Abdala. Em 21 de outubro, Martí é detido e encarcerado.
1870 Martí é condenado a seis anos de presídio político e logo transferido por indulto à Ilha de Pinos.
1871 Deportação para a Espanha. Publicação do ensaio El presidio político en Cuba. Matricula-se na Universidade Central de Madri como estudante de direito.
1872 Transferência a Zaragoza por motivos de saúde, em conseqüência de uma doença contraída durante sua condenação nas pedreiras de Havana. Começa a escrever seu drama Adúltera.
1873 Estudos de direito e filosofia na Universidade de Zaragoza. Publicação do trabalho: A República Espanhola ante a Revolução Cubana.
1874 Faz o exame de bacharel e obtém as licenciaturas em Direito Civil e Canônico e em Filosofia e Letras. Em dezembro, abandona a Espanha e visita várias cidades da França. Embarca para o México em Le Havre.
1875 Chega a Veracruz, México. Começa seu trabalho na redação da Revista Universal, onde publica um boletim sob o pseudônimo de “Orestes” e traduz partes de Mes Fils de Víctor Hugo.
1876 Delegado ao Primeiro Congresso Operário Mexicano. Em dezembro, embarca para Cuba.
1877 Regressa ao México e se instala na Guatemala onde é nomeado catedrático de filosofia na Escola Normal Central da Guatemala. Em dezembro, viaja ao México para contrair matrimônio com Carmen Zayas.
1878 Publica o folheto Guatemala. Regressa à sua cátedra na Guatemala; mas renuncia após poucos meses e viaja para Cuba. É negada sua solicitação de exercer a advocacia. Nasce seu filho, José Francisco, em Havana.
1879 Discursos políticos em Cuba. Nova deportação para a Espanha. Em dezembro, viaja para a França.
1880 Chega a Nova York. Inicia sua colaboração com os periódicos The Hour e The Sun.
1881 Viaja para a Venezuela. Funda a Revista Venezuelana. Regressa a Nova York. Inicia sua colaboração com A Opinião Nacional, de Caracas.
1882 Publica seu primeiro livro de Versos: Ismaelillo. Escreve seus Versos livres. É nomeado correspondente do La Nación, de Buenos Aires.
1883 Direção da revista La América em Nova York. Publica várias traduções, entre outras a de Noções Lógicas, de Stanley Jevons; e sua famosa “Carta” sobre a morte de Marx.
1884 Entrevista com Máximo Gómez e Antonio Maceo em Nova York. Analista dos movimentos sociais nos Estados Unidos.
1885 Publicação de numerosas crônicas e estudos sobre a vida social, política, científica e cultural nos Estados Unidos.
1886 Correspondente do La Nación, de Buenos Aires; do El Partido Liberal, do México; do La República, de Honduras; e do La Opinión Pública, de Montevidéu.
1887 Morte do pai em Havana. Novamente é nomeado Cônsul do Uruguai. Prossegue sua intensa atividade jornalística.
1888 Representante da Associação de Imprensa de Buenos Aires no Canadá e Estados Unidos. É nomeado sócio-correspondente da Academia de Ciências e Belas Artes de São Salvador.
1889 Publica o folheto Cuba e os Estados Unidos, e edita o primeiro número de sua revista dedicada às crianças da América: A Idade de Ouro.
1890 É nomeado Cônsul da Argentina e do Paraguai em Nova York; e representante do Uruguai na Comissão Monetária Internacional Americana em Washington.
1891 Renuncia a seus cargos diplomáticos para dedicar-se à causa da independência de Cuba com toda a liberdade. Publica seus Versos Simples e o ensaio Nuestra América. Pronuncia seus famosos discursos: Com todos e para o bem de todos e Os pinos nuevos.
1892 Funda o Partido Revolucionário Cubano e edita o primeiro número de seu jornal Pátria. Viagens e discursos pelos Estados Unidos, Haiti, Jamaica e Santo Domingo.
1893 Continua suas viagens e sua atividade em favor da independência de Cuba.
1894 Entrevista com Máximo Gómez em Nova York e Filadélfia. Viagens pela América Central e pelo Caribe, organizando a guerra de independência. Entrevista com Porfirio Díaz no México. Regressa aos Estados Unidos.
Citações importantes:
Sobre Nossa América:“Na América, há dois povos e não mais que dois, de alma muito distinta pelas origens, antecedentes e costumes e só semelhantes na identidade fundamental humana. De um lado, está nossa América e todos seus povos que são de uma natureza e de berço parecido ou igual e igual mistura imperante; da outra parte, está a América que não é nossa . . .”
Sobre a unidade:“É a hora do reencontro e da marcha unida e temos de andar em quadro apertado, como a prata nas raízes dos Andes . . .
Sobre a cultura nacional: “A universidade européia há de ceder à universidade americana. A história da América, dos incas até aqui, há de ser ensinada de cor, ainda que não ensine a das arcas da Grécia. Nossa Grécia é preferível à Grécia que não é nossa. É, para nós, mais necessária. Os políticos nacionais hão de substituir os políticos exóticos. Enxerte-se o mundo em nossas repúblicas, mas o tronco tem de ser o de nossas repúblicas. E cale-se o pedante vencido, pois não há pátria em que o homem possa ter mais orgulho do que nas nossas dolorosas repúblicas americanas.”
Sobre os jovens na América:“Os jovens da América arregaçam a camisa, metem as mãos na massa e a fazem crescer com a levedura de seu suor. Entendem que se imita demasiadamente e que a salvação está em criar. Criar é a senha desta geração. “O vinho, de banana; e se ficar azedo, é nosso vinho !”
Sobre a luta ideológica:“Trincheira de idéias valem mais do que trincheiras de pedra... Uma idéia enérgica, flamada a tempo ante o mundo, detém, como a bandeira mística do juízo final, um esquadrão de encouraçados.”
Sobre a autocrítica:“Estratégia é política. Os povos hão de viver criticando-se, porque a crítica é a saúde; mas, com um só peito e uma só mente. Abaixar-se até os infelizes e erguê-los nos braços. Com o fogo do coração descongelar a América coagulada!”
O legado filosófico de José Martí
Não tememos as palavras e podemos concordar com aqueles que afirmam que entramos em uma era pós-moderna e, a esta altura da história, só há duas formas de conceber um tempo posterior à idade moderna: uma seria o caos presente na dramática realidade de hoje que ameaça destruir a civilização que chamaram de ocidental e inclusive toda a humanidade. Outra consiste em coroar a idade da razão com princípios éticos e iniciar a verdadeira história do homem. Tudo o que foi anteriormente criado ficará sendo pré-história. É a única forma racional de assumir uma época que suceda à modernidade e ao capitalismo.
Não há mais alternativa do que enfocar problemas de caráter filosófico, deixando para trás terminologias de origem européia que estabelecem uma cerca com as massas e ir diretamente ao pensamento dos maiores filósofos do velho continente nos dois últimos séculos.
Na história da humanidade, não houve nenhuma mudança importante que não estivesse precedida por uma elaboração intelectual. Não há império romano sem direito romano e a cultura que se acumulou no Mediterrâneo; não teria existido ascensão do capitalismo no trânsito entre a idade média e a moderna, sem o Renascimento; tampouco, teriam existido revoluções burguesas e ascensão do capitalismo europeu, nos finais dos séculos XVIII e XIX, sem a ilustração e os enciclopedistas; não haveria, tampouco, movimento emancipador da nossa América, sem a enorme cultura representada por Bolívar, Martí e os próceres e pensadores de nossas pátrias. Os exemplos podem ser muitos outros.
A necessidade de uma reflexão filosófica e cultural profunda nos está imposta pelos tempos de mudança em que vivemos. Em que consistiria? Como enfrentar, na prática, os problemas teóricos fundamentais de nossa época para abrir caminho à ação eficaz?
Para encontrar o caminho de um novo pensamento filosófico latino-americano, devemos partir de seus antecedentes e identificar quais são os problemas concretos de hoje.
Em 1887, nosso Herói Nacional, ao analisar com visão premonitória os perigos que se gestavam a partir dos Estados Unidos, assinalou : Vão-se levantando no espaço, como imensos e lentos fantasmas, os problemas vitais da América: – os tempos pedem algo mais do que fábricas da imaginação e urdimento de beleza. Podem-se ver – em todos os rostos e em todos os países, como símbolos da época – a vacilação e a angústia. O Mundo inteiro é hoje uma imensa pergunta.
Passaram-se mais de cem anos destas palavras e elas mantêm uma vigência renovada. Como responder a esta pergunta no século XXI quando o desafio se apresenta de uma maneira mais dramática e universal? Os cubanos contam com o arsenal de idéias filosóficas presentes no pensamento de José Martí. Assinalemos as seguintes :
– As concepções acerca do que ele chamou de “a ciência do espírito”.
– As idéias expressas com beleza poética nos versos do poema Yugo y estrella.
– Os enfoques de grande valor no campo da pedagogia, em relação aos vínculos entre a maldade e a estupidez e entre a bondade e a inteligência.
– O conceito de que todo homem leva dentro dele uma fera adormecida, porém, ao mesmo tempo, somos seres admiráveis capazes de colocar rédeas na fera.
– A aspiração a uma filosofia com a essência do conceito de universo, quer dizer, uno no diverso.
– A idéia acerca de uma filosofia das relações.
– Os critérios acerca da importância da educação e da cultura na libertação humana.
– As idéias éticas e estéticas e a relação entre elas: Verso: ou nos condenam juntos / ou nos salvamos os dois.
– O princípio que estabelece: Enxerte-se o mundo em nossas repúblicas; porém, o tronco tem de ser o de nossas repúblicas.
– As concepções sobre o equilíbrio do mundo, analisadas tanto no individual como no social, assim como em sua dimensão universal.
Estas idéias martianas e muitas outras, mais vistas em sua relação com o melhor do pensamento filosófico universal de todas as épocas, desde a mais remota antiguidade até a atualidade, manifestam uma carga de ciência e utopia, de realidade e sonho por um mundo melhor.
Em Martí, fazem síntese: o imenso saber da modernidade européia; a mais pura tradição ética de raízes cristãs, que em Cuba nunca se situou em antagonismo com as ciências; a influência despreconceituosa das idéias da maçonaria, em seu sentido mais universal e de solidariedade humana; a tradição bolivariana e latino-americana, que Martí enriqueceu com sua vida no México, América Central e Venezuela; e as idéias e sentimentos antiimperialistas surgidos a partir das próprias entranhas do império ianque, onde ele viveu durante mais de quinze anos, mais que um terço de sua vida, e completou ali seu pensamento político, social e filosófico, a partir da óptica dos interesses latino-americanos. Foi, sem dúvida, o analista mais profundo sobre a realidade norte-americana da última metade do século XIX.
Antônio Gramsci afirmou que toda grande filosofia começava por verdades do senso comum. Vejamos a primeira: todo homem precisa comer, vestir-se, ter um teto, antes de fazer filosofia, religião e cultura. Derivemos dela a segunda: não há homem, no sentido universal que nós todos conhecemos, sem a cultura.
Que ensinamento extraem os cubanos hoje, destas idéias e de suas conseqüências ulteriores? A primeira e mais importante lição está em que o déficit principal do que se chamou esquerda nos últimos cem anos foi ter divorciado as lutas sociais e de classes da melhor tradição cultural latino-americana. Isto não sucedeu dessa forma em Cuba. Aqui, durante o século XX, articulou-se o legado patriótico e antiimperialista do século XIX com as idéias socialistas.
José Martí representa o símbolo supremo de dois séculos de história cubana e americana. Uma cultura que, desde sua gestação e nascimento, está dedicada à ação e, portanto, vinculada aos problemas imediatos de nossa atualidade.
Amar e pensar, eis aí a mensagem martiana que devemos assumir frente aos desafios que a humanidade tem diante de si.
Por Armando Hart Dávalos
Fonte: http://www.comitebolivarianosp.org/america/view.asp?id=46
Da série: América índia e latina e seus libertadores
Frank País, o grande líder clandestino, um pouco afastado, aproveitava o tempo dando manutenção às armas dos rebeldes, ação que se gravaria na memória de Che Guevara, que escreveu depois em seu diário:
“Não presenciei a entrevista, mas segundo me contou Fidel, o homem mostrou-se amigável e não fez perguntas capciosas. Perguntou a Fidel se ele era antiimperialista; respondendo-lhe que sim, que ele era, no sentido de almejar livrar sua pátria das cadeias econômicas, mas não de odiar os Estados Unidos e seu povo. Fidel queixou-se da ajuda militar prestada a Batista, fazendo com que ele visse quão ridículo era pretender que essas armas eram para a defesa do continente, quando não podiam acabar com um grupo de rebeldes na Serra Maestra.”
O diálogo entre Fidel e Matthews se caracterizou pela sutileza do cubano, onde o humor e a originalidade apareciam nos momentos mais relevantes e mais difíceis. A tropa de rebeldes tentava, de qualquer jeito, impressionar o repórter, sem cair em alardes nem mentiras que pusessem em dúvida a veracidade, a existência real e a força da guerrilha.
Por isso, desde o início, Fidel deu a ordem de manter uma atmosfera marcial diante do repórter norte-americano e dar uma imagem de grupo que simulasse ser mais numeroso do que era realmente. Enquanto decorrria a entrevista, os rebeldes entrevam e saíam constantemente do acampamento, aparentando um maior número de pessoas. Isso correspondia à insinuação de Almeida a respeito da existência de vários acampamentos no entorno.
Alguns guerrilheiros, como Manuel Fajardo, passavam ao lado de Matthews, impedindo que ele reparasse em sua camisa completamente rasgada. Outro momento engenhoso, foi quando o então capitão Raúl Castro Ruz, após a chegada do combatente Luis Crespo, informou Fidel:
— Comandante, chegou o enlace da coluna 2!
Fidel ao reparar na tramóia de Raúl, respondeu-lhe:
— Diga-lhe que espere que eu terminaecom o repórter.
A famosa entrevista durou ao redor de três horas. Matthews, visivelmente satisfeito, pediu para Fidel lhe autografar a agenda e assim conferir maior autenticidade aos dados obtidos. Fidel acedeu ao pedido e acrescentou a data do encontro histórico nesse dia.
A certa distância, Guerra Matos viu feliz a despedida do chefe guerrilheiro e do jornalista. Agora tinha uma ordem ainda mais complexa a executar: devia voltar a Manzanillo com Matthews em pleno dia. Javier Pazos o acompanharia no regresso, ao qual se somaria o jovem camponês Reynerio Márquez, que os dirigiria à casa de uma filha de Epifanio, ao lado do caminho do Jíbaro.
“Não presenciei a entrevista, mas segundo me contou Fidel, o homem mostrou-se amigável e não fez perguntas capciosas. Perguntou a Fidel se ele era antiimperialista; respondendo-lhe que sim, que ele era, no sentido de almejar livrar sua pátria das cadeias econômicas, mas não de odiar os Estados Unidos e seu povo. Fidel queixou-se da ajuda militar prestada a Batista, fazendo com que ele visse quão ridículo era pretender que essas armas eram para a defesa do continente, quando não podiam acabar com um grupo de rebeldes na Serra Maestra.”
O diálogo entre Fidel e Matthews se caracterizou pela sutileza do cubano, onde o humor e a originalidade apareciam nos momentos mais relevantes e mais difíceis. A tropa de rebeldes tentava, de qualquer jeito, impressionar o repórter, sem cair em alardes nem mentiras que pusessem em dúvida a veracidade, a existência real e a força da guerrilha.
Por isso, desde o início, Fidel deu a ordem de manter uma atmosfera marcial diante do repórter norte-americano e dar uma imagem de grupo que simulasse ser mais numeroso do que era realmente. Enquanto decorrria a entrevista, os rebeldes entrevam e saíam constantemente do acampamento, aparentando um maior número de pessoas. Isso correspondia à insinuação de Almeida a respeito da existência de vários acampamentos no entorno.
Alguns guerrilheiros, como Manuel Fajardo, passavam ao lado de Matthews, impedindo que ele reparasse em sua camisa completamente rasgada. Outro momento engenhoso, foi quando o então capitão Raúl Castro Ruz, após a chegada do combatente Luis Crespo, informou Fidel:
— Comandante, chegou o enlace da coluna 2!
Fidel ao reparar na tramóia de Raúl, respondeu-lhe:
— Diga-lhe que espere que eu terminaecom o repórter.
A famosa entrevista durou ao redor de três horas. Matthews, visivelmente satisfeito, pediu para Fidel lhe autografar a agenda e assim conferir maior autenticidade aos dados obtidos. Fidel acedeu ao pedido e acrescentou a data do encontro histórico nesse dia.
A certa distância, Guerra Matos viu feliz a despedida do chefe guerrilheiro e do jornalista. Agora tinha uma ordem ainda mais complexa a executar: devia voltar a Manzanillo com Matthews em pleno dia. Javier Pazos o acompanharia no regresso, ao qual se somaria o jovem camponês Reynerio Márquez, que os dirigiria à casa de uma filha de Epifanio, ao lado do caminho do Jíbaro.
Fidel discursando para a multidão
INTERCEPTADOS NOVAMENTE POR UMA PATRULHA DO EXÉRCITO
Guerrita contou:
“Depois da entrevista, mandaram-nos passar para cumprimentar Fidel. O comandante-em-chefe mostrou interesse em saber como foi a viagem do repórter, qual caminho tomaram, quais medidas de precaução foram tomadas e insistiu em que tinha que ser mais cauteloso ao voltar, a fim de impedir que acontecesse alguma coisa ao jornalista.
“Recordei a Fidel que o conheci dez anos atrás, quando dos fatos da campanha de La Demajagua.” Guerrita revelou que o Fidel da Serra Maestra era o mesmo homem convicto e convincente, porém ainda mais inspirado. Gesticulava e punha otimismo em cada uma de suas palavras, que eram capazes de alentar a pessoa mais desanimada.
“Fui para Cayo Espino, para a quinta de meu pai a fim de buscar o carro que ali estava. Voltei e recolhi o norte-americano na casa de Epifanio e às 13h estávamos já em Cayo Espino.
“Sirva o almoço ao jornalista e que ele goste muito. O norte-americano tem que sair daqui com barriga cheia e coração contente’, disse Guerrita com tom de brincadeira a sua mãe e seu pai, camponeses admiradores e colaboradores das forças do Movimento 26 de Julho.”
Enquanto a família de Guerra Matos aprimorava a refeição cubana típica para satisfazer o visitante, o repórter apenas mastigou um pedacinho de frango e, com a maior cortesia do mundo, proferiu, para supresa de todos, cinco palavras que fizeram mudar completamente o itinerário:
Please, take me to Manzanillo. (Por favor, me leva a Manzanillo).
Guerrita não percebeu nesse momento que o pensamento do jornalista estava muito longe de seu estômago, e sua maior fome se concentrava na notícia que tinha gravada em sua cabeça e nos papéis que guardava zelosamente nos bolsos da camisa.
Uma patrulha do exército interceptou-os novamente na rodovia, mas Guerrita conseguiu desinformá-los outra vez. Ao redor das 17h, chegaram à casa de Saumell, onde sua esposa Nancie o esperava sentada na sala.
No limiar da porta, com breves palavras, Matthews propôs a Nancie partir imediatamente para Santiago de Cuba. Subiram apressados no carro que os levaria para o lugar. Viajaram de Santiago de Cuba para Havana num avião e no dia seguinte, o casal de norte-americanos foi para Nova Iorque.
Ao embarcar no avião, Nancie parecia mais gordinha que ao chegar. Será que teria abandonado seu regime, por causa da atraente comida cubana? Nada está mais longe disso. A esperta mulher havia colocado sob a roupa os papéis com todos os apontamentos que fez Matthews de sua entrevista histórica com Fidel. Enganaram, com discreta artimanha, os inspetores da alfândega e a rede dos ferozes membros do Sistema de Inteligência Militar de Batista.
Guerrita, por sua parte, continuou cumprindo suas tarefas, ora como mensageiro ora no translado de combatentes para a Serra Maestra. No mesmo dia em que Matthews abandonou Manzanillo, ele se encarregou de levar para a quinta de Epifanio Díaz mais três expedicionários do iate Granma, dispersos durante o desembarque.
Dias depois da partida do repórter para os Estados Unidos, Guerrita examinava diariamente os jornais à espera de um artigo escrito por Matthews. E no domingo, 24 de fevereiro de 1957, reparou que nas manchetes do El Diario de la Marina apareceu este título de grande impacto:
Fidel Castro
O IMPACTO DAQUELA ENTREVISTA FOI IMPRESSIONANTE
Fidel está vivo!
E mais abaixo, o seguinte sumário:
Entrevistado por Matthews, do “The New York Times”, na Serra. “Rebelde cubano é visitado em seu esconderijo”, aparecia depois na cabeça da página. E depois, a foto do chefe guerrilheiro com um fuzil de mira telescópica e a cópia fotostática do autógrafo que Fidel assinou na agenda do jornalista.
Guerrita, sentado no volante de seu jipe, começou a ler minuciosamente o artigo escrito por Matthews no The New York Times, que foi reinserido pelo El Diario de la Marina em suas páginas.
Matthews começava sua reportagem com esta afirmação:
“Fidel Castro, o chefe da juventude cubana, está vivo e está combatendo fortemente e com sucesso nos inóspitos e quase impenetráveis bosques da Serra Maestra, no extremo sul da Ilha.
“O presidente Fulgencio Batista mantém seu exército nessa região, mas os militares estão travando uma batalha, até agora, perdida para destruir o inimigo mais perigoso, ao qual o general Batista teve que enfrentar em sua longa e difícil carreira como líder e ditador cubano.
“Esta é a primeira notícia certa de que Fidel Castro ainda está vivo e em Cuba. Ninguém relacionado com o mundo exterior, e ainda menos com a imprensa, viu o senhor Castro, exceto este repórter. Ninguém em Havana, inclusive na Embaixada dos Estados Unidos, com todos seus recursos para a recopilação de informação, saberá até ser publicado este artigo que Fidel Castro está realmente na Serra Maestra.”
Matthews não escondeu neste artigo sua repulsa pelo regime de Fulgencio Batista e manifestou categoricamente: “Fidel Castro e seu Movimento 26 de Julho são o símbolo inflamado da oposição ao regime”.
Mais adiante argumentou: “Para facilitar meu acesso à Serra Maestra e meu encontro com Fidel Castro, dezenas de homens e mulheres em Havana e na província de Oriente correram verdadeiramente um grande perigo”.
Guerrita pensou que aquele homem de bonê e cachimba estava referindo-se a ele, e que em nenhum momento transpareceu que sabia do grande perigo que corriam ao levá-lo para se encontrar com Fidel. Por isso, quando releu a linha: “um grande perigo”, cresceu sua admiração pelo repórter veterano.
Continuou lendo e deparou que Matthews fazia um esboço biográfico de Fidel desde o ataque ao quartel Moncada até a expedição do iate Granma. Depois, referiu-se às diversas versões em torno da provável morte de Fidel, que desmentiu taxativamente. A seguir, informou de sua entrevista com Fidel e concluiu com uma breve referência a sua saída para Nova Iorque.
Dias depois, Guerrita deleitou-se novamente com mais dois artigos de Matthews, em que examinava a situação atual de Cuba.
O governo de Batista não teve outra alternativa que suspender a censura da imprensa. Ao que parece, tinha reconsiderado isso a partir da publicação dos artigos de Matthews, uma vez que estes poderiam ser aproveitados pela imprensa internacional para causar um grande escândalo e pôr em ridículo seu regime.
Por isso, os principais órgãos de imprensa de Cuba reproduziram os artigos de Matthews, ao passo que o ministro da Defesa, Santiago Verdeja, emitia algumas declarações em que qualificava as notícias de Matthews como os capítulos de um romance fantástico.
“O senhor Matthews não se entrevistou com o tal insurgente”, ressaltava.
O porta-voz governista impugnava a autenticidade da foto de Fidel e fundamentava sua dúvida com estas palavras:
“Parece ingênuo que, apesar de ter tido a oportunidade de se embrenhar naquelas montanhas e ter realizado a entrevista, não se retratasse com ele para confirmá-lo.”
Guerrita sabia que René lhe tinha tirado algumas fotos a Matthews e a Fidel quando conversavam na Serra Maestra. Talvez, pensou, os negativos se tivessem arruinado ou não tivessem a melhor qualidade para serem visíveis nas páginas de um jornal. Lembrou que Frank subiu também com uma máquina fotográfica, mas não se lembra dele tirando fotografias.
O regime batistiano tentava por todos os meios negar a veracidade da entrevista de Matthews com Fidel, a qual se espalhava por toda a Ilha. Aos depoimentos de Verdeja somaram-se os do chefe militar da província de Oriente, Martín Díaz Tamayo, que declarou à imprensa cubana: “É absolutamente impossível cruzar as linhas onde há tropas. A entrevista é história”.
Em 28 de fevereiro, como um facão no pescoço dos sicários de Batista, El Diario de la Marina mostrava, tirada do The New York Times, na capa a foto esperada em que apareciam Matthews e Fidel dialogando. A foto instantânea, que à velocidade da luz percorreu o mundo, mostrava à esquerda o repórter fazendo apontamentos. À direita, de perfil, o comandante-em-chefe Fidel Castro, com seu boné verde-olivo e sua barba de guerrilheiro, acendendo um charuto cubano, cujas chamas aclaravam as pupilas esperançosas das camadas mais humildes do povo.
Guerrita matos tirou seus óculos e enxugou-os com a ponta da camisa. Depois, pô-los novamente para poder apreciar com mais nitidez a foto tirada por seu companheiro René Rodríguez. Então mostrou um leve sorriso, arrancou o carro e partiu às pressas para a Serra Maestra.http://granmai.cubasi.cu/portugues/2007/febrero/mar20/8mattews-p.html
Fidel Castro Ruz
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José Martí (1883-1895)
(Cintio Vitier)
De onde cresce a palma
Primogênito de modestos imigrantes, José Martí, sem nunca renegar sua raiz hispânica, sentiu-se fruto de Cuba, a terra que o viu nascer. Sendo ainda um menino, os espetáculos sanguinolentos da escravidão fizeram-no pronunciar um juramento: “lavar com sua vida o crime”. Ao despontar sua adolescência, já era um lutador contra o colonialismo, que o condenou a trabalho forçado, com corrente e grilhão no pé, num presídio político cujos horrores ele denunciaria e no qual, paradoxalmente, forjou sua liberdade espiritual, sua ética militante, com a qual chegou a pregar uma guerra de libertação “necessária”, mas “sem ódio”.
Seu desterro em Madri e Zaragoza, onde estudou, confirmou, por um lado, seu vínculo com o espírito rebelde do povo da Espanha e por outro, que Cuba não podia esperar nada de seus governos, monárquicos ou republicanos. Sua peregrinação pelo México, Guatemala e Venezuela fê-lo experimentar os problemas das novas repúblicas ainda lastradas por vícios coloniais. Sua permanência de cerca de 15 anos nos Estados Unidos permitiu-lhe conhecer a fundo os grandes criadores da cultura, os méritos e perigos de seu sistema social, as características de seu povo e a crescente tendência imperialista de seu governo.
Este périplo vital foi expresso numa obra literária e jornalística de primeira magnitude, que adquiriu seu impulso definitivo a partir da viagem de Martí à Venezuela em 1881. O orador do discurso no Clube de Comércio de Caracas, o editorialista da Revista Venezuelana, o poeta de Ismaelillo, o autor do Prólogo ao Poema de Niágara de Juan Antonio Pérez Bonalde, já é o iniciador de uma nova literatura hispano-americana que vai ter um Rubén Darío – que chamou Martí de “Mestre” quando este caiu em Dois Rios – sua cabeça mais visível.
Entretanto, Martí não se dedicou – e essa é outra lição da parábola de sua vida – a lavrar para si uma reputação literária, mas sim pôs seu gênio verbal, como orador e como jornalista, a serviço da causa de Cuba e da que chamara, em páginas memoráveis, de “Nossa América”, à conscientização da qual dedicou o testemunho de seus Cenários Norte-americanos.
Vida toda ela dominada pela ética, pelo sentido do dever e do sacrifício, quando José Martí proclama o Partido Revolucionário Cubano, a 10 de abril de 1892 em Nova York, os humildes emigrados na Flórida já começavam a chamá-lo por um apelido – o Apóstolo – que significativamente ultrapassava os marcos políticos habituais.
A partir daquela proclamação precedida por um discurso fundador do novo projeto República – “Com todos, e para o bem de todos”, pronunciado no Liceu de Tampa a 26 de novembro de 1891 – a atividade revolucionária de Martí alcança uma intensidade surpreendente, refletida em seus discursos, em seus artigos no jornal Pátria, em seu epistolário e em suas viagens incessantes, incluindo as que teve de fazer para garantir a incorporação dos dois generais mais prestigiosos da Guerra dos Dez Anos : Máximo Gómez, eleito General-em-chefe do Exército Libertador, e Antonio Maceo.
No citado discurso, Martí tinha dito: “Ou a República tem por base o caráter inteiro de cada um de seus filhos – o hábito de trabalhar com suas mãos e pensar por si próprio, o exercício íntegro de si e o respeito, como de honra de família, ao exercício íntegro dos demais: a paixão, enfim, pelo decoro do homem – ou a República não vale uma lágrima de nossas mulheres nem uma só gota de sangue de nossos bravos.”
Princípios desta fecundidade aparecem nos documentos que inspiraram, no fim da guerra, a república martiana, tais como o artigo Nossas idéias, Manifesto de Montecristi e as últimas cartas a Federico Henríquez y Carvajal e a Manuel Mercado. Segundo estes e muitos outros textos, a República seria uma democracia integral, sem privilégios de raça nem de classe, fundada no desfrute eqüitativo da riqueza e da cultura, e em reivindicação das massas produtoras.
Por outra parte, na citada carta a seu confidente mexicano, poucas horas antes de cair em combate, escreveu: “...já estou todos os dias em perigo de dar minha vida por meu país e por meu dever – posto que o entendo e tenho vontade de realizá-lo.” Para Martí, esse dever consistia em impedir a tempo, ao ficar Cuba independente da Espanha, que um novo imperialismo se estendesse pelas Antilhas e caísse ainda com maior força sobre as terras da América.
Para isso, pois, e não só para libertar Cuba do jugo espanhol, organizou José Martí a nova guerra, na qual caiu, em 19 de maio de 1895.
No fundo do povo, a parábola martiana continuou minando lições e apelos, pois como ele disse também a Mercado: “Vou desaparecer, mas meu pensamento não desaparecerá.”
Sua maior glória está em ter sabido falar aos pobres e às crianças, em ter sabido viver e morrer por eles. Continuará, por conseguinte, iluminando-os com seu exemplo, já que sua obra na terra que o viu nascer, na terra toda, não tem fim.
Seu desterro em Madri e Zaragoza, onde estudou, confirmou, por um lado, seu vínculo com o espírito rebelde do povo da Espanha e por outro, que Cuba não podia esperar nada de seus governos, monárquicos ou republicanos. Sua peregrinação pelo México, Guatemala e Venezuela fê-lo experimentar os problemas das novas repúblicas ainda lastradas por vícios coloniais. Sua permanência de cerca de 15 anos nos Estados Unidos permitiu-lhe conhecer a fundo os grandes criadores da cultura, os méritos e perigos de seu sistema social, as características de seu povo e a crescente tendência imperialista de seu governo.
Este périplo vital foi expresso numa obra literária e jornalística de primeira magnitude, que adquiriu seu impulso definitivo a partir da viagem de Martí à Venezuela em 1881. O orador do discurso no Clube de Comércio de Caracas, o editorialista da Revista Venezuelana, o poeta de Ismaelillo, o autor do Prólogo ao Poema de Niágara de Juan Antonio Pérez Bonalde, já é o iniciador de uma nova literatura hispano-americana que vai ter um Rubén Darío – que chamou Martí de “Mestre” quando este caiu em Dois Rios – sua cabeça mais visível.
Entretanto, Martí não se dedicou – e essa é outra lição da parábola de sua vida – a lavrar para si uma reputação literária, mas sim pôs seu gênio verbal, como orador e como jornalista, a serviço da causa de Cuba e da que chamara, em páginas memoráveis, de “Nossa América”, à conscientização da qual dedicou o testemunho de seus Cenários Norte-americanos.
Vida toda ela dominada pela ética, pelo sentido do dever e do sacrifício, quando José Martí proclama o Partido Revolucionário Cubano, a 10 de abril de 1892 em Nova York, os humildes emigrados na Flórida já começavam a chamá-lo por um apelido – o Apóstolo – que significativamente ultrapassava os marcos políticos habituais.
A partir daquela proclamação precedida por um discurso fundador do novo projeto República – “Com todos, e para o bem de todos”, pronunciado no Liceu de Tampa a 26 de novembro de 1891 – a atividade revolucionária de Martí alcança uma intensidade surpreendente, refletida em seus discursos, em seus artigos no jornal Pátria, em seu epistolário e em suas viagens incessantes, incluindo as que teve de fazer para garantir a incorporação dos dois generais mais prestigiosos da Guerra dos Dez Anos : Máximo Gómez, eleito General-em-chefe do Exército Libertador, e Antonio Maceo.
No citado discurso, Martí tinha dito: “Ou a República tem por base o caráter inteiro de cada um de seus filhos – o hábito de trabalhar com suas mãos e pensar por si próprio, o exercício íntegro de si e o respeito, como de honra de família, ao exercício íntegro dos demais: a paixão, enfim, pelo decoro do homem – ou a República não vale uma lágrima de nossas mulheres nem uma só gota de sangue de nossos bravos.”
Princípios desta fecundidade aparecem nos documentos que inspiraram, no fim da guerra, a república martiana, tais como o artigo Nossas idéias, Manifesto de Montecristi e as últimas cartas a Federico Henríquez y Carvajal e a Manuel Mercado. Segundo estes e muitos outros textos, a República seria uma democracia integral, sem privilégios de raça nem de classe, fundada no desfrute eqüitativo da riqueza e da cultura, e em reivindicação das massas produtoras.
Por outra parte, na citada carta a seu confidente mexicano, poucas horas antes de cair em combate, escreveu: “...já estou todos os dias em perigo de dar minha vida por meu país e por meu dever – posto que o entendo e tenho vontade de realizá-lo.” Para Martí, esse dever consistia em impedir a tempo, ao ficar Cuba independente da Espanha, que um novo imperialismo se estendesse pelas Antilhas e caísse ainda com maior força sobre as terras da América.
Para isso, pois, e não só para libertar Cuba do jugo espanhol, organizou José Martí a nova guerra, na qual caiu, em 19 de maio de 1895.
No fundo do povo, a parábola martiana continuou minando lições e apelos, pois como ele disse também a Mercado: “Vou desaparecer, mas meu pensamento não desaparecerá.”
Sua maior glória está em ter sabido falar aos pobres e às crianças, em ter sabido viver e morrer por eles. Continuará, por conseguinte, iluminando-os com seu exemplo, já que sua obra na terra que o viu nascer, na terra toda, não tem fim.
CRONOLOGIA DE JOSÉ MARTÍ
1853 janeiro, 28. Nasce em Havana, à Calle de Paula N.° 41, José Martí; filho de Mariano Martí, de Valencia, e de Leonor Pérez, de Santa Cruz de Tenerife.
1857 Martí viaja com seus pais à Espanha.
1859 Regresso de Martí a Cuba.
1866 Início dos estudos de Segundo Grau, depois de ter estudado com o poeta Rafael María de Mendive.
1869 Martí publica seus primeiros escritos independentistas no jornal El Diablo Cojuelo, de seu amigo, Fermín Valdés. Faz o primeiro e único número de seu jornal La Patria Livre, onde aparece seu drama Abdala. Em 21 de outubro, Martí é detido e encarcerado.
1870 Martí é condenado a seis anos de presídio político e logo transferido por indulto à Ilha de Pinos.
1871 Deportação para a Espanha. Publicação do ensaio El presidio político en Cuba. Matricula-se na Universidade Central de Madri como estudante de direito.
1872 Transferência a Zaragoza por motivos de saúde, em conseqüência de uma doença contraída durante sua condenação nas pedreiras de Havana. Começa a escrever seu drama Adúltera.
1873 Estudos de direito e filosofia na Universidade de Zaragoza. Publicação do trabalho: A República Espanhola ante a Revolução Cubana.
1874 Faz o exame de bacharel e obtém as licenciaturas em Direito Civil e Canônico e em Filosofia e Letras. Em dezembro, abandona a Espanha e visita várias cidades da França. Embarca para o México em Le Havre.
1875 Chega a Veracruz, México. Começa seu trabalho na redação da Revista Universal, onde publica um boletim sob o pseudônimo de “Orestes” e traduz partes de Mes Fils de Víctor Hugo.
1876 Delegado ao Primeiro Congresso Operário Mexicano. Em dezembro, embarca para Cuba.
1877 Regressa ao México e se instala na Guatemala onde é nomeado catedrático de filosofia na Escola Normal Central da Guatemala. Em dezembro, viaja ao México para contrair matrimônio com Carmen Zayas.
1878 Publica o folheto Guatemala. Regressa à sua cátedra na Guatemala; mas renuncia após poucos meses e viaja para Cuba. É negada sua solicitação de exercer a advocacia. Nasce seu filho, José Francisco, em Havana.
1879 Discursos políticos em Cuba. Nova deportação para a Espanha. Em dezembro, viaja para a França.
1880 Chega a Nova York. Inicia sua colaboração com os periódicos The Hour e The Sun.
1881 Viaja para a Venezuela. Funda a Revista Venezuelana. Regressa a Nova York. Inicia sua colaboração com A Opinião Nacional, de Caracas.
1882 Publica seu primeiro livro de Versos: Ismaelillo. Escreve seus Versos livres. É nomeado correspondente do La Nación, de Buenos Aires.
1883 Direção da revista La América em Nova York. Publica várias traduções, entre outras a de Noções Lógicas, de Stanley Jevons; e sua famosa “Carta” sobre a morte de Marx.
1884 Entrevista com Máximo Gómez e Antonio Maceo em Nova York. Analista dos movimentos sociais nos Estados Unidos.
1885 Publicação de numerosas crônicas e estudos sobre a vida social, política, científica e cultural nos Estados Unidos.
1886 Correspondente do La Nación, de Buenos Aires; do El Partido Liberal, do México; do La República, de Honduras; e do La Opinión Pública, de Montevidéu.
1887 Morte do pai em Havana. Novamente é nomeado Cônsul do Uruguai. Prossegue sua intensa atividade jornalística.
1888 Representante da Associação de Imprensa de Buenos Aires no Canadá e Estados Unidos. É nomeado sócio-correspondente da Academia de Ciências e Belas Artes de São Salvador.
1889 Publica o folheto Cuba e os Estados Unidos, e edita o primeiro número de sua revista dedicada às crianças da América: A Idade de Ouro.
1890 É nomeado Cônsul da Argentina e do Paraguai em Nova York; e representante do Uruguai na Comissão Monetária Internacional Americana em Washington.
1891 Renuncia a seus cargos diplomáticos para dedicar-se à causa da independência de Cuba com toda a liberdade. Publica seus Versos Simples e o ensaio Nuestra América. Pronuncia seus famosos discursos: Com todos e para o bem de todos e Os pinos nuevos.
1892 Funda o Partido Revolucionário Cubano e edita o primeiro número de seu jornal Pátria. Viagens e discursos pelos Estados Unidos, Haiti, Jamaica e Santo Domingo.
1893 Continua suas viagens e sua atividade em favor da independência de Cuba.
1894 Entrevista com Máximo Gómez em Nova York e Filadélfia. Viagens pela América Central e pelo Caribe, organizando a guerra de independência. Entrevista com Porfirio Díaz no México. Regressa aos Estados Unidos.
1895 Viagem a Montecristo, onde redige o Manifesto de Montecristo e sua carta-testamento política a Federico Henríquez y Carvajal; sua carta-testamento literária a Gonzalo de Quesada y Aróstegui; e sua carta não-concluída a Manuel Mercado. A 15 de abril, o Generalíssimo Máximo Gómez o nomeia Major-General. A 19 de maio, cai mortalmente ferido numa ação de guerra em Dois Rios. Seu cadáver é transferido para Santiago de Cuba. É enterrado em 27 de maio.
Síntese de seu pensamento:
-- Antiimperialista e verdadeiro paladino da unificação da América Latina e do Caribe. Na sua condição de delegado do Partido Revolucionário Cubano, pôs em prática sua concepção de política exterior que, baseada no latino-americanismo e no antiimperialismo, não limitava seu desempenho ao estabelecimento de nexos com os governos e a estendia aos povos. Em dezembro de 1889, Martí pronunciou um discurso conhecido como “Mãe América”, que constitui todo um projeto de política exterior, onde fixa os princípios que deviam reger as relações interamericanas e a unidade de nossos povos, como força imprescindível para frear e enfrentar a conquista da América Latina pelos Estados Unidos.
─ Identifica a revolução com as profundas mudanças ansiadas por essa massa não resgatada que reflete em sua mísera situação todos os horrores da grande exploração colonial. Dirá “Com os pobres da terra quero minha sorte lançar.”
─ Entende que a verdadeira revolução há de nascer da massa indígena, porque é nela onde a dignidade americana tem sido vilmente ultrajada e onde estão contidas, portanto, as exigências mais radicais para a reivindicação de uma nova vida.
─ Pensa que a independência sozinha não é a solução para as novas repúblicas. Para ele, a independência, se não vai acompanhada de um profundo projeto libertário orientado a erradicar todas as deformações criadas pela dominação estrangeira – tanto econômicas como políticas e culturais – não será mais do que uma simples troca de formas. Por isso, advertiu: “O problema da independência não era a troca de formas, mas sim a troca de espírito.”
Síntese de seu pensamento:
-- Antiimperialista e verdadeiro paladino da unificação da América Latina e do Caribe. Na sua condição de delegado do Partido Revolucionário Cubano, pôs em prática sua concepção de política exterior que, baseada no latino-americanismo e no antiimperialismo, não limitava seu desempenho ao estabelecimento de nexos com os governos e a estendia aos povos. Em dezembro de 1889, Martí pronunciou um discurso conhecido como “Mãe América”, que constitui todo um projeto de política exterior, onde fixa os princípios que deviam reger as relações interamericanas e a unidade de nossos povos, como força imprescindível para frear e enfrentar a conquista da América Latina pelos Estados Unidos.
─ Identifica a revolução com as profundas mudanças ansiadas por essa massa não resgatada que reflete em sua mísera situação todos os horrores da grande exploração colonial. Dirá “Com os pobres da terra quero minha sorte lançar.”
─ Entende que a verdadeira revolução há de nascer da massa indígena, porque é nela onde a dignidade americana tem sido vilmente ultrajada e onde estão contidas, portanto, as exigências mais radicais para a reivindicação de uma nova vida.
─ Pensa que a independência sozinha não é a solução para as novas repúblicas. Para ele, a independência, se não vai acompanhada de um profundo projeto libertário orientado a erradicar todas as deformações criadas pela dominação estrangeira – tanto econômicas como políticas e culturais – não será mais do que uma simples troca de formas. Por isso, advertiu: “O problema da independência não era a troca de formas, mas sim a troca de espírito.”
Citações importantes:
Sobre Nossa América:“Na América, há dois povos e não mais que dois, de alma muito distinta pelas origens, antecedentes e costumes e só semelhantes na identidade fundamental humana. De um lado, está nossa América e todos seus povos que são de uma natureza e de berço parecido ou igual e igual mistura imperante; da outra parte, está a América que não é nossa . . .”
Sobre a unidade:“É a hora do reencontro e da marcha unida e temos de andar em quadro apertado, como a prata nas raízes dos Andes . . .
Sobre a cultura nacional: “A universidade européia há de ceder à universidade americana. A história da América, dos incas até aqui, há de ser ensinada de cor, ainda que não ensine a das arcas da Grécia. Nossa Grécia é preferível à Grécia que não é nossa. É, para nós, mais necessária. Os políticos nacionais hão de substituir os políticos exóticos. Enxerte-se o mundo em nossas repúblicas, mas o tronco tem de ser o de nossas repúblicas. E cale-se o pedante vencido, pois não há pátria em que o homem possa ter mais orgulho do que nas nossas dolorosas repúblicas americanas.”
Sobre os jovens na América:“Os jovens da América arregaçam a camisa, metem as mãos na massa e a fazem crescer com a levedura de seu suor. Entendem que se imita demasiadamente e que a salvação está em criar. Criar é a senha desta geração. “O vinho, de banana; e se ficar azedo, é nosso vinho !”
Sobre a luta ideológica:“Trincheira de idéias valem mais do que trincheiras de pedra... Uma idéia enérgica, flamada a tempo ante o mundo, detém, como a bandeira mística do juízo final, um esquadrão de encouraçados.”
Sobre a autocrítica:“Estratégia é política. Os povos hão de viver criticando-se, porque a crítica é a saúde; mas, com um só peito e uma só mente. Abaixar-se até os infelizes e erguê-los nos braços. Com o fogo do coração descongelar a América coagulada!”
O legado filosófico de José Martí
Não tememos as palavras e podemos concordar com aqueles que afirmam que entramos em uma era pós-moderna e, a esta altura da história, só há duas formas de conceber um tempo posterior à idade moderna: uma seria o caos presente na dramática realidade de hoje que ameaça destruir a civilização que chamaram de ocidental e inclusive toda a humanidade. Outra consiste em coroar a idade da razão com princípios éticos e iniciar a verdadeira história do homem. Tudo o que foi anteriormente criado ficará sendo pré-história. É a única forma racional de assumir uma época que suceda à modernidade e ao capitalismo.
Não há mais alternativa do que enfocar problemas de caráter filosófico, deixando para trás terminologias de origem européia que estabelecem uma cerca com as massas e ir diretamente ao pensamento dos maiores filósofos do velho continente nos dois últimos séculos.
Na história da humanidade, não houve nenhuma mudança importante que não estivesse precedida por uma elaboração intelectual. Não há império romano sem direito romano e a cultura que se acumulou no Mediterrâneo; não teria existido ascensão do capitalismo no trânsito entre a idade média e a moderna, sem o Renascimento; tampouco, teriam existido revoluções burguesas e ascensão do capitalismo europeu, nos finais dos séculos XVIII e XIX, sem a ilustração e os enciclopedistas; não haveria, tampouco, movimento emancipador da nossa América, sem a enorme cultura representada por Bolívar, Martí e os próceres e pensadores de nossas pátrias. Os exemplos podem ser muitos outros.
A necessidade de uma reflexão filosófica e cultural profunda nos está imposta pelos tempos de mudança em que vivemos. Em que consistiria? Como enfrentar, na prática, os problemas teóricos fundamentais de nossa época para abrir caminho à ação eficaz?
Para encontrar o caminho de um novo pensamento filosófico latino-americano, devemos partir de seus antecedentes e identificar quais são os problemas concretos de hoje.
Em 1887, nosso Herói Nacional, ao analisar com visão premonitória os perigos que se gestavam a partir dos Estados Unidos, assinalou : Vão-se levantando no espaço, como imensos e lentos fantasmas, os problemas vitais da América: – os tempos pedem algo mais do que fábricas da imaginação e urdimento de beleza. Podem-se ver – em todos os rostos e em todos os países, como símbolos da época – a vacilação e a angústia. O Mundo inteiro é hoje uma imensa pergunta.
Passaram-se mais de cem anos destas palavras e elas mantêm uma vigência renovada. Como responder a esta pergunta no século XXI quando o desafio se apresenta de uma maneira mais dramática e universal? Os cubanos contam com o arsenal de idéias filosóficas presentes no pensamento de José Martí. Assinalemos as seguintes :
– As concepções acerca do que ele chamou de “a ciência do espírito”.
– As idéias expressas com beleza poética nos versos do poema Yugo y estrella.
– Os enfoques de grande valor no campo da pedagogia, em relação aos vínculos entre a maldade e a estupidez e entre a bondade e a inteligência.
– O conceito de que todo homem leva dentro dele uma fera adormecida, porém, ao mesmo tempo, somos seres admiráveis capazes de colocar rédeas na fera.
– A aspiração a uma filosofia com a essência do conceito de universo, quer dizer, uno no diverso.
– A idéia acerca de uma filosofia das relações.
– Os critérios acerca da importância da educação e da cultura na libertação humana.
– As idéias éticas e estéticas e a relação entre elas: Verso: ou nos condenam juntos / ou nos salvamos os dois.
– O princípio que estabelece: Enxerte-se o mundo em nossas repúblicas; porém, o tronco tem de ser o de nossas repúblicas.
– As concepções sobre o equilíbrio do mundo, analisadas tanto no individual como no social, assim como em sua dimensão universal.
Estas idéias martianas e muitas outras, mais vistas em sua relação com o melhor do pensamento filosófico universal de todas as épocas, desde a mais remota antiguidade até a atualidade, manifestam uma carga de ciência e utopia, de realidade e sonho por um mundo melhor.
Em Martí, fazem síntese: o imenso saber da modernidade européia; a mais pura tradição ética de raízes cristãs, que em Cuba nunca se situou em antagonismo com as ciências; a influência despreconceituosa das idéias da maçonaria, em seu sentido mais universal e de solidariedade humana; a tradição bolivariana e latino-americana, que Martí enriqueceu com sua vida no México, América Central e Venezuela; e as idéias e sentimentos antiimperialistas surgidos a partir das próprias entranhas do império ianque, onde ele viveu durante mais de quinze anos, mais que um terço de sua vida, e completou ali seu pensamento político, social e filosófico, a partir da óptica dos interesses latino-americanos. Foi, sem dúvida, o analista mais profundo sobre a realidade norte-americana da última metade do século XIX.
Antônio Gramsci afirmou que toda grande filosofia começava por verdades do senso comum. Vejamos a primeira: todo homem precisa comer, vestir-se, ter um teto, antes de fazer filosofia, religião e cultura. Derivemos dela a segunda: não há homem, no sentido universal que nós todos conhecemos, sem a cultura.
Que ensinamento extraem os cubanos hoje, destas idéias e de suas conseqüências ulteriores? A primeira e mais importante lição está em que o déficit principal do que se chamou esquerda nos últimos cem anos foi ter divorciado as lutas sociais e de classes da melhor tradição cultural latino-americana. Isto não sucedeu dessa forma em Cuba. Aqui, durante o século XX, articulou-se o legado patriótico e antiimperialista do século XIX com as idéias socialistas.
José Martí representa o símbolo supremo de dois séculos de história cubana e americana. Uma cultura que, desde sua gestação e nascimento, está dedicada à ação e, portanto, vinculada aos problemas imediatos de nossa atualidade.
Amar e pensar, eis aí a mensagem martiana que devemos assumir frente aos desafios que a humanidade tem diante de si.
Por Armando Hart Dávalos
Fonte: http://www.comitebolivarianosp.org/america/view.asp?id=46
Da série: América índia e latina e seus libertadores
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