CANTIGA DA LUCIDEZ INDESEJADA
(Ladjane Bandeira)
Meu Deus, não me faças lúcida
Que teus pássaros não são.
Se quiseres serei fada
Como a que vi desenhada
No livro do meu irmão.
Mas só não me faças lúcida
Que meus desejos não são.
Também não me tornes anjo
Que as asas me pesariam
Eu buscaria nas flores
A causa dos meus ardores
E as flores me negariam.
Então não me tornes anjo
Que as flores me perderiam.
As estrelas moram longe
Mas eu não quero as estrelas
Dá-me os pássaros e o rio
Dá-me as estações do estio
Que eu seu pra que vou querê-las
Que aquelas que moram longe
Eu me contento com vê-las.
Mas não, não me faças santa
Que eu não poderia ser
É preciso ter crescido
Ter pecado e arrependido:
É fazer pra desfazer.
Ai, não, não me faças santa
Que eu nem sei o que é viver
E dizem que pra ser santa
A gente morre pra vida
Mas eu não quero morrer.
Meu Deus, não me faças lúcida
Que meus receios não são
E nem dês as estrelas
Deixa, pois, que por sofrê-las
As tenhas sofrido em vão.
Mas nunca me faças lúcida
Mas nunca me faças lúcida
Que meus desejos não são.
E não me ponhas aureola
Que por usá-la constante
Me daria obrigação.
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