(Por Mauro Santayana)
O exame, sereno, mas rigoroso, do que foi o julgamento da Ação 470, mostra que o
sistema judiciário, como um todo, e a sua mais elevada instância, o STF, de modo
particular, reclamam reforma profunda. Não obstante a oratória de alguns
juízes, e a erudição de outros, os observadores mais atentos perceberam que a
razão lógica não esteve presente no resultado final do julgamento. Houve
sinuosos silogismos para justificar o apelo, apressado e desengonçado, a uma
teoria, a do domínio do fato, prontamente desautorizado pelo seu mais
eminente expositor, o jurista Claus Roxin. Segundo Roxin, ela só vale onde há
ordem comprovada para a ação delituosa.
O ato de
julgar não é técnico, como proclamam alguns, nem subjetivo, de acordo com
outros: deve ser expressão de sabedoria e de humanismo. Ao condenar um réu, o
juiz não deve fazê-lo em nome da vingança da vítima ou do Estado, mas em defesa
da sociedade. Os mais antigos buscavam seus juízes entre os mais velhos, não
porque a idade lhes conferisse o senso de justiça, mas também porque, tendo
vivido mais, a sua reputação era consolidada, suas paixões vencidas, seu medo
domado.
Isso não
impedia, no entanto, clamorosas injustiças, sobretudo quando os juízes atuavam
sob a chancela religiosa. Saramago, quando alguém o recriminou pela sua opção
ideológica, e lembrou os crimes do stalinismo (como os do Processo de Moscou, de
1938), retrucou, lembrando que as vítimas da Inquisição foram muitíssimo mais
numerosas e seu sofrimento maior. Giordano Bruno caminhou até a fogueira, onde o
queimaram vivo, levando, pelas ruas de Roma, em uma espécie de gaiola, sua
língua amputada. Ele poderia ter acrescentado que não só os católicos e os
protestantes foram responsáveis pela carnificina daqueles que consideravam
hereges ou bruxos.
Matar em nome de
Deus é uma desculpa sórdida e comum a todos os fanatismos – desde o registro
bíblico de que Jeová, o Senhor dos Exércitos, entregava ao povo de Israel os
seus inimigos, para que fossem passados ao fio da espada os vencidos, sem poupar
as crianças.
Não parece bom
o sistema de escolha dos juízes do tribunal supremo da República. Há casos em
que os indicados são desconhecidos dos meios jurídicos. O Senado atua quase como
repartição protocolar. E, uma vez nomeado, o juiz permanecerá no cargo até os 70
anos – limite que muitos desejam ultrapassar.
Para corrigir
parte dessa situação, o Senador Roberto Requião apresentou proposta de emenda
constitucional que estabelece o mandato máximo de 12 anos para os ministros do
Supremo. É um bom começo – mas, até que isso assim se resolva, o Senado é
chamado à sua responsabilidade de examinar, cuidadosamente, a vida, o passado e
o saber dos candidatos.
Fonte: http://www.maurosantayana.com/
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