terça-feira, 24 de abril de 2012

Apocalypse now amazônico

Desde a sua descoberta, o ouro de Serra Pelada foi alvo de disputas violentas. Primeiro, entre a companhia Vale do Rio Doce, então uma empresa estatal que por lei detinha os direitos minerais da região, e os garimpeiros que chegaram à região com a notícia das primeiras pepitas. A Vale na época era presidida por Eliezer Batista, empreendedor lendário, personagem discreto e central na história recente do Brasil e pai de Eike Batista, hoje o homem mais rico do país. Por dialética do destino, dirijo também uma biografia de Eliezer que chega aos cinemas em novembro. No fim dos depoimentos, ele aceita falar sobre a Serra, recua na cadeira e nos revela que até ameaça de morte sofreu para não mexer com a briga pelos direitos de exploração do ouro. O fato de o presidente da maior mineradora estatal brasileira ser ameaçado é simbólico e impressionante. “Nunca houve nada igual àquilo, nem na febre de ouro na Califórnia, nada se compara a Serra Pelada, é uma coisa única no mundo”, diz Eliezer.

Imagem: Antonio Venâncio
Curió na época de interventor no garimpo
Curió na época de interventor no garimpo
Com o fim da mineração, os ex-garimpeiros formaram uma vila em torno do lago onde hoje vivem 7 mil habitantes, que podem chegar a 20 mil em semanas de assembleia e eleições. Ocupada por pessoas que não puderam, ou não quiseram, voltar para suas terras natais e que decidiram resistir e guardar a cava. Sentinelas mágicas de um faroeste do século 21. Existem poucas opções de trabalho e uma população envelhecida aguarda o desfecho da história, vivendo de aposentadoria em terrenos da União que devem ser desocupados quando a mina for mecanizada um dia.
A vila de Serra Pelada faz parte do município de Curionópolis, que tem esse nome em homenagem a Sebastião Curió. Figura lendária do sul do Pará, versão real do coronel Kurtz de um Apocalypse now amazônico, personagem raro da história recente do país, ele comandou a ofensiva final contra a guerrilha do Araguaia e foi acusado pelo desaparecimento e pela morte de vários opositores da ditadura militar. Depois de ser nomeado interventor do garimpo, elegeu-se deputado federal. Em 1984, rompeu com o governo e com a CVRD (que foi indenizada em US$ 60 milhões pelo Estado por um ouro que não explorou) e fundou a cooperativa que detém os direitos minerários até hoje. Eleito por três vezes prefeito de Curionópolis, ele foi cassado em abril de 2008 por compra de votos. No documentário, Curió é um dos personagens centrais, por conta dos depoimentos históricos reveladores durante as filmagens.

“Nunca houve nada igual àquilo, nem na febre do ouro na Califórnia”, diz Eliezer Batista, ameaçado de morte quando era presidente da Vale

Depois de constantes disputas entre diferentes facções pelo comando da Coomigasp, que culminaram com mortes e prisões em maio de 2008, Curió foi afastado das negociações sobre o futuro da mina, e uma nova diretoria foi eleita. Hoje a situação parece mais calma. Com mediação do governo federal, o pedido de lavra está encaminhado, e as sondagens continuam, embora o contrato com a Colossus sofra variadas contestações.
Para Breno Santos, ex-geólogo da Vale, se a própria Vale, com toda a sua eficiência empresarial, desistiu de Serra Pelada, nenhuma empresa colocaria dinheiro lá. É apenas uma lenda. Para o geólogo John Hellman, responsável pelas sondagens da empresa canadense em andamento, é um sonho também. Mas mineração é isso, sonhar com o que existe dentro da terra.
A visão dos velhos garimpeiros é bem diferente da dos especialistas. Na beira da cava, seu Trovão para de lavar roupa por um momento e nos conta que “embaixo de tudo tem uma laje de ouro e depois uma jazida de diamantes com 2 km de extensão. E no meio tem uma pedra, já pesquisada, do tamanho de uma geladeira que no mundo todinho, no universo todinho, não há dinheiro que pague essa pedra, só a pedra!”.


Imagem: Reprodução
Rita Cadlilac no apoteótico show na Serra Pelada
Imagem: Reprodução
A ex-chacrete requebra para os garmpeiros
Imagem: Reprodução
A performance valeu até um sabonete em homenagem a Rita
Em 1985, Rita Cadillac fez um apoteótico show em um circo armado em Serra Pelada e tornou-se a musa dos garimpeiros. A então chacrete se esfregou com as roupas atiradas em delírio na direção do palco e deixou no local uma coleção de calcinhas, disputadas como trofeus. O cachê de Rita foi pago com pepitas de ouro. Diz a lenda que criaram e venderam em Serra um sabonete com a forma de sua histórica retaguarda. As cenas acimas foram tiradas de série de documentários The world about us, feita pela rede britânica BBC

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