Escultura de Ron Mueck |
E se muitos dos problemas que estão mobilizando milhões de jovens em todo o mundo não puderem ser resolvidos pelos governantes dos seus países? E se as reivindicações não forem apenas por mudanças em relação a quem ocupa os governos, mas sobre o que é o próprio governo?
Muito se tem discutido sobre a dimensão nacional da atual onda de
mobilizações que varreu o Brasil em junho: mobilidade, planejamento
urbano, inclusão social, liberdades morais, luta contra a corrupção,
reforma política. Mas não são apenas as questões “de cada país” que
estão por trás do fato de milhões de jovens, nos mais diversos países do
mundo, estarem saindo às ruas.
Existe um sentimento muito maior que tem feito as pessoas se
mobilizarem, questões muito mais amplas do que dizem os cartazes, posts
no Facebook ou tweets. Existe algo implícito nas mobilizações que estão
ocorrendo em todo o mundo, algo que não é dito por que simplesmente não
sabemos o nome, e que, por enquanto, é apenas possível de ser sentido
por quem está nas ruas e no máximo teorizado abstratamente pela Academia
ou por poucos quadros políticos.
É um sentimento de pertencimento a um movimento que não se resolverá
com mudanças sobre como são eleitos e o que fazem os 600 e poucos
representantes do povo brasileiro (embora todos saibamos que isso é
muito importante!). É um sentimento que quer apoiar e estar ao lado dos
jovens que estão nas ruas da Turquia, do Egito, de Nova Iorque, de
Paris, de Madri, de Atenas ou de Santiago do Chile. É um sentimento de
quem descobre fazer parte de algo maior, um sentimento de identificação
com o que até então não passava de um “estrangeiro”.
É um sentimento que de tão novo ainda não tomou forma e é difícil de
expressar num cartaz. Como se dizia “antigamente”, ainda não é um
“Programa Político”. Não existem Partidos que tratem dele porque não
existem Parlamentos que o discutam. Ele é um sentimento político porque
trata sobre a forma como as pessoas vivem no mundo, mas não cabe nas
atuais instituições da política.
Aos poucos, de forma cada vez mais rápida, as fronteiras entre os
países têm deixado de serem divisões ou as línguas, barreiras para a
compressão. As imagens instantâneas de um jovem sendo agredido,
distribuídas de forma instantânea por outro jovem ali presente, sem a
frieza de uma agência de notícias, já falam uma linguagem universal, que
supera qualquer diferença cultural, religiosa ou étnica.
Esse processo não começou ontem e talvez nem seja tão recente assim
(é capaz que os historiadores do futuro vejam que ele já tem alguns
séculos), mas é inegável que ele está atingindo um novo estágio de
velocidade, de conexão, de identidade, de universalidade. Provavelmente
ainda não seja o estágio de maturidade necessária capaz de fazer brotar
novas instituições, mas ele já começa a ensaiar os seus primeiros passos
dessa nova etapa.
Ao longo da história as mobilizações sociais sempre vieram antes das
definições. O povo sempre sabe quando algo está errado, quando a
violação dos seus direitos atinge níveis inaceitáveis. Primeiro vem a
indignação individual, depois a coletiva e apenas depois, muito tempo
depois, elas são interpretadas, se transformam em sujeito político e se
tornam instituições.
Questões como o Sistema Financeiro, o Meio Ambiente e os direitos de
liberdade e privacidade na Internet, já não podem ser resolvidas no
âmbito nacional, são temas globais, para os quais os Estados nacionais
praticamente não têm mecanismos para atuarem de forma efetiva.
Talvez o dia em que os cartazes dessas ruas e praças venham a ter as
mesmas mensagens e se mobilizem de forma verdadeiramente articulada,
lutando por novas instituições globais, ainda possa demorar, mas para a
tristeza dos que professaram o fim da história, esse dia já está em
gestação, no coração desses milhares de anônimos.
Alberto Kopittke é advogado e vereador em Porto Alegre
Fonte:http://www.sul21.com.br/jornal/2013/08/o-novo-sempre-vem-por-alberto-kopittke/
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