
Mestre Janio de, Freitas,com o misto de esperança e ceticismo de quem viu a história transcorrer por décadas, escreve hoje na Folha algo que precisava ser dito sobre este caso da Operação Lava-Jato.
Que a “limpeza”das relações entre política e empresas – e,
especialmente, as grandes empreiteiras de obras públicas – está bem
longe de ser assegurada por ela.
Janio, um dos mais incansáveis e combativos jornalistas a denunciá-la
– quem não se lembra de sua inspiração de publicar com antecedência, em
semi-código, o resultado de licitações “armadas” – sabe do que está
falando.
Sem mudar a política do dinheiro, de que tanto se gosta, não se terminará com o dinheiro escuso na política.
Mudar para continuar
Janio de Freitas
Um escândalo é um escândalo, não é uma solução. O otimismo, que não é
só de Dilma Rousseff, mas foi por ela sintetizado na convicção de que o
escândalo da Petrobras “pode mudar o país para sempre” ao “acabar com a
impunidade”, já foi submetido a muitos testes. E não passou por nenhum.
No caso extremo dessas esperadas mudanças a história oferece a
fileira de golpes de Estado, consumados ou não. A cada recuperação do
regime legal estuprado pelos militares, “nunca mais haveria golpe”. Até
vir o seguinte.
Entre nós, na melhor hipótese, mudam-se os métodos. Já na primeira
eleição com princípios democráticos, pós-ditadura militar, exibiu-se o
golpe eleitoral preventivo. Solucionou o temido risco de violência
civil, em dimensão nacional, contra a conspiração e o golpe militar no
caso da possível eleição de Lula. Agora mesmo passeia pelas ruas de São
Paulo uma gangue de marcolas ideológicos pedindo um golpe sob a forma de
impeachment.
Passa-se o mesmo com a impunidade. Além de não acabar só porque a
prisão de empreiteiros seria exemplar, assume no próprio escândalo da
Petrobras uma nova face, para facilitar-lhe a permanência. A delação
premiada é uma forma de impunidade. O patife delata alguns comparsas,
devolvem o que ninguém sabe se é o todo do que furtaram, e vão viver em
casa como aposentados ricos (o que devolveram não inclui o que ganharam
com uso do dinheiro furtado, nem há quem saiba qual foi esse ganho
total). Em palavras de Rodrigo Janot, que mantém um desempenho muito
acima de seus dois últimos antecessores como procurador-geral da
República, e falou à Folha:
“Eu só não aceito perdão judicial [no acordo de delação]. Se for um
crime que tenha já [direito a] semiaberto, sempre que for possível eu
vou botar no aberto. Vá cumprir pena em casa, sem problema nenhum”.
Importante na delação premiada não é a conduta criminosa,
antissocial, é a recuperação do valor furtado –o dinheiro ou o bem
valioso posto como valor acima de todos. Só o preconceito moral
distinguirá o cidadão honesto do criminoso premiado pela delação. E pelo
investimento do furto, porque, entre os dois, o tolo não é ele.
Ainda assim, um outro otimismo ruiu aos primeiros depoimentos de
empreiteiros presos. Negaram-se a responder aos inquiridores,
contrariando a convicção dos controladores da Operação Lava Jato,
exposta por Rodrigo Janot, de que as prisões levariam os empreiteiros “a
falar mesmo”. Se não respondem, não aceitam a delação premiada. Se não a
aceitam, o comprometimento dependerá de que o delator-acusador prove o
que disse ou investigações policiais consigam fazê-lo. Dificuldade que,
no caso dos grandes corruptores da administração pública, não costuma
perturbar a impunidade, aqui ou lá fora.
Fonte: http://tijolaco.com.br/blog/?p=23122
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