Amy morreu e nós, os muito românticos, não estamos passando muito bem.
A próxima vítima é a letra de mão. A caligrafia. Nos EUA, caminha para o fim. Pelo menos nas escolas já é quase uma defunta. A charge do Jean, hoje na pág. 2 da Folha, diz tudo sobre o assunto.
Não, não me venha com essa de velho nostálgico. A parada é outra. Não confunda nostalgia com romantismo.
A defesa, nesta taverna virtual, é a do discurso amoroso. Seja escrito no tablet ou no papiro.
Mas... como o carteiro acaba de me entregar uma missiva escrita à mão de moça, com direito a beijo de batom junto da assinatura –que boca grande e linda, meu Deus!- não posso deixar de repetir, ad infinitum, uma das minhas campanhas permanentes.
Ô, mr. Postman, pela volta da carta de amor. Urgentemente. A carta escrita à mão, com local de origem, data, saudações, motivos, papel fininho e pautado.
Debruce a munheca sobre o papiro e faça da tinta da caneta o seu próprio sangue. Agora.
Não temas a breguice, o romantismo, como já disse o velho Pessoa, travestido de Álvaro de Campos, todas cartas de amor são ridículas, e não seriam de amor se ridículas não fossem.
A carta, mesmo com todas as modernidades e invencionices, ainda é o melhor veículo para declarar-se, comunicar afinidades e iniciar um feitio de orações. O meio é a mensagem.
O que você está esperando, vá ali na esquina, compre um belo papel e envelopes, e se devote.
Se tiver alguma rusga, peça perdão por escrito, pois perdão por escrito vale como documento de cartório.
Se o namoro ainda não tiver começado, largue a mão dessas cantadas baratas e curtições facebookianas e atire a garrafa aos mares.
Uma boa carta de amor é irresistível. Vale até copiar aqueles modelos que vêm nos livros. Sele o envelope com a língua, como nas antigas, lamba os selos com devoção, esse pré-beijo de todos os lábios da futura amada.
Às moças é consentido, além dos floreios e da caligrafia mais arrumadinha, a reprodução de um beijo, com batom bem vermelho, ao final, perto da assinatura, como a que recebi agora.
Uma carta, até mesmo de amizade, deixa a gente comovido, como a que me mandou o Fábio Victor, escriba e amigo do Recife, quando habitava a velha e fria Londres.
Que os amigos,e não apenas os amantes, se correspondam, fazendo dos envelopes no fundo do baú as suas histórias de vida.
Pela volta da carta, que já é por si só uma maneira devota, um tempo que se tira, sem pressa, para dedicar-se a quem se gosta. Pela volta da carta, pois o que se diz numa carta é de outra natureza, é o bem-querer em tom solene.
O que você está esperando, meu amigo, minha amiga, largue esse cronista de lado e debruce-se sobre a escrivaninha. Uma mesa de bar ou de um café também são bons lugares para assentar as suas mal-traçadas linhas.
Corra, Lola, corra. Escreva, meu rapaz, escreva!
Fonte: http://xicosa.folha.blog.uol.com.br/arch2011-07-24_2011-07-30.html
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