segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Em clima de natal


Onde será que anda aquele Papai Noel
de porcelana que minha mãe colocava
todos os anos embaixo da Árvore de Natal?


Artur de Carvalho


Entrei na sala de espera de um escritório e lá estava ela. Era moderna, quase irreconhecível em suas linhas retas recortadas em plástico transparente. Só as bolas coloridas e a estrela prateada ainda a caracterizavam como uma autêntica e genuína Árvore de Natal.

Houve um tempo em que a primeira Árvore de Natal do ano sempre me causava um certo espanto. Eu não conseguia conter um comentário “— Nossa, mas já é Natal de novo?” ou “— Parece que ainda ontem eu estava comendo o último pedaço do tender do reveillon!”. Acontece que até esses comentários se tornaram meio repetitivos. Todos os anos o Natal chega mais rápido do que a gente imaginava que ia chegar. Todos os anos o ano acaba mais depressa. Todos os anos o comércio prepara uma Promoção de Natal onde são sorteados carros e motos entre os consumidores. Todos os anos os jornais na TV começam a tecer comentários comparando o péssimo Natal deste ano com o maravilhoso Natal do ano passado e mostram os comerciantes preocupados e as vitrines enfeitadas com placas de liquidação.

No Fantástico, vai ter aquela reportagem mostrando aquele mundaréu de gente andando pelos corredores refrigerados de um Shopping, e outra cena mostrando as lojas vazias, e aí um balconista comentando que o movimento deste ano caiu bastante em comparação com os outros anos, e depois uma entrevista com um consumidor dizendo que só vai comprar umas lembrancinhas e olhe lá.

E depois vai ter aquelas entrevistas na rua, perguntando o que é que o pessoal vai fazer com o décimo terceiro, e a maioria vai fazer piadinha, que vai pegar o décimo terceiro e pagar as contas e assim mesmo não vai dar, e outros dizendo que vai ter ovo frito e carne moída na ceia desse ano ah ah ah, e depois a reportagem fecha com uma velhinha dizendo que vai comprar sim uns presentinhos e que Natal é só uma vez por ano, que vale a pena e tudo o mais, e ela vai olhar para a tela e sorrir e o pessoal da produção do jornal vai colocar uma musiquinha de Natal no fundo, e corta para os apresentadores e eles dizem boa noite sorrindo.

E o Papai-Noel vai chegar de helicóptero numas cidades, e vai descer de pára-quedas em outras, e vai dar a volta num carro de bombeiros em outras, e em outras ainda o prefeito vai dar a chave da cidade para o Papai Noel e vai sair uma foto do evento na manchete do jornal do dia seguinte e depois as lojas vão ser invadidas por velhinhos aposentados com fantasias calorentas e distribuindo balas e tocando sininhos e o repórter da TV vai entrevistar um deles e ele vai fazer um rô rô rô e o pessoal da produção vai colocar uma musiquinha de Natal no fundo, e corta para os apresentadores e eles dizem boa noite sorrindo.

É meio melancólico ficar velho. Não triste. Melancólico.


Artur de Carvalho
colabora com o "Diário de Votuporanga", interior de São Paulo, desde 1997. É autor dos livros "O Incrível Homem de Quatro Olhos", edição do autor — Votuporanga, 2000, e "Pah!", Vialettera Editora, 2003. Além de excelente escritor, Artur é um cartunista dos melhores, que você poderá ver em seu site, e lá comprar os livros.

Texto e ilustração inéditos, enviados pelo autor diretamente ao Releituras.

Sitio: www.arturdecarvalho.com.br

Fonte: http://www.releituras.com/acarvalho_pnoel.asp

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