sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Visitando o passado para compreender o presente

Estrada em Jaguaribe
Arquivo fotográfico da biblioteca digital do IBGE


Nas minhas andanças pela net, buscando identificar as estradas entre Pernambuco/Paraíba/Ceará no início do século XX, encontrei o texto: PRIMÓRDIOS DA REDE URBANA CEARENSE, do Prof. Dr. Clovis Ramiro Jucá Neto, da Universidade Federal do Ceará - Curso de Arquitetura e Urbanismo. Dele, recortei o trecho sobre as estradas coloniais do Ceará. O trabalho na íntegra está publicado na revista Mercator - Revista de Geografia da UFC, ano 08, número 16, 2009, pp. 77-102.
Na net, vc pode encontrá-la no seguinte endereço:
http://www.mercator.ufc.br/index.php/mercator/article/viewFile/40/223
Não reproduzimos as figuras, apenas o texto. No texto original, elas ajudam bastante a visualizar os percursos. A sugestão é que se você gostou, consulte-o porque vale a pena.


AS ESTRADAS COLONIAIS DO CEARÁ
"As principais estradas dos boiadeiros foram a Estrada Velha, Estrada Geral do Jaguaribe, a Estrada Nova das Boiadas, a Estrada das Boiadas, a Estrada Camocim-Ibiapaba, a Estrada Crato Oeiras, a Estrada Crato Piancó.
No final do século XVII, a Estrada Velha ligava Recife ao Maranhão pelo litoral (STUDART FILHO,1937, p.18).
A Estrada Geral do Jaguaribe partia de Aracati, principal porto da Capitania, descia o rio Jaguaribe, passava em Russas e Icó e seguindo o rio Salgado ultrapassava a chapada do Araripe para alcançar os sertões do Pernambuco em direção à Bahia. Foi a mais importante via de circulação do Ceará no século XVIII, por onde eram levadas as mercadorias para o sertão, vindas de Aracati, provenientes das demais capitanias. Por ela também eram carregados os produtos das salinas cearenses para as regiões do rio São Francisco. Em direção ao Aracati seguia toda a produção do vale do Jaguaribe que “consistia quase unicamente em couros salgados e espichados e alguma pellica das que se trabalhavam em todo o sertão cearense” (Ibidem, p.29) e as boiadas que seriam salgadas nas oficinas de charque no litoral e transportadas em embarcações, a maioria eram sumacas, para Recife, Salvador e Rio de Janeiro. Pelo rio Jaguaribe, Icó e Aracati – as duas principais vilas do Ceará no século XVIII – mantiveram um intenso comércio, inicialmente com o gado e posteriormente, no século XIX, com o algodão.
A Estrada Nova das Boiadas ligava o vale do rio Acaraú, no Ceará, e o Piauí à Paraíba, pelo Ceará.
Vindo da direção da Paraíba, passava por Pau-dos-Ferros, ultrapassava o rio Jaguaribe na altura da atual cidade de Jaguaribe, seguia pelo riacho do Sangue, cruzava o rio das Pedras, chegava ao rio Banabuiú e encontrava o rio Quixeramobim para alcançar a cidade de Quixeramobim. De lá, um ramal seguia para Crateús45, entrando no Piauí pelo rio Poti. Outro ramal partia para Sobral seguindo para o porto de Acaraú, na bacia do rio Acaraú e em direção a Granja, rumo ao porto de Camocim, na bacia do rio Coreaú. Depois de Pau-dos-Ferros, no Rio Grande do Norte, encontrava a Estrada das Boiadas, na Paraíba, e seguia para a cidade de Recife (STUDART FILHO, 1937, p.30).
A Estrada das Boiadas vinha do médio Parnaíba em direção a Oeiras e a atual Valença, ambas no Piauí; passava por Tauá, seguia o rio Jaguaribe até Icó, quando, alcançando a Paraíba, seguia por Souza, Pombal, Patos, Campina Grande, Ingá, Mogeiro e Itabaiana. De Itabaiana partia ou em direção a João Pessoa via Pilar e Santa Rita, ou em direção ao porto de Recife e Olinda, cruzando Pedra do Fogo,Itambé e por fim Goiana e Igarassu, em Pernambuco. De Tauá, podia-se alcançar a Estrada Nova das
Boiadas. Pela Estrada da Boiadas eram abastecidos tanto os matadouros e as oficinas de charque do litoral, seguindo pela Estrada Geral em direção ao Aracati, como as feiras de gado em Campina Grande, Itabaiana, Pedra do Fogo e Itambé, na Paraíba, e Goiana e Igarassu, em Pernambuco. Dela também se serviam os fazendeiros do sertão para refazer seus gados, nas pastagens do rio Parnaíba, após as longas estiagens (STUDART FILHO, 1937, p.31).
A Estrada Camocim-Ibiapaba ligava Viçosa do Ceará, na serra da Ibiapada, a Granja e ao porto de Camocim pela bacia do Coreaú. Quixeramobim interligava-se, ainda, com os sertões da atual Santa Quitéria pela Estrada da Caiçara. Do Crato, partia-se tanto para Oeiras – Estrada Crato-Oeiras - via Campos Sales e Picos pelos vales férteis do Araripe, como para Piancó – Estrada Crato-Piancó - alcançando Patos, na Estrada das Boiadas, já na Paraíba (STUDART FILHO, 1937, p.35-39).
Até os primeiros anos do século XIX, com exceção de Aquiraz (1713) e Fortaleza (1726), localizadas no litoral, as demais vilas de branco fundadas no território cearense localizavam-se em pontos estratégicos para a circulação do gado nas estradas das boiadas (figura 77). Tratamos de Icó (1736), Aracati (1748), Sobral (1773), Granja (1776), Quixeramobim (1789), Russas (1801) e Tauá (1802). Aracati localizava-se na foz do rio Jaguaribe, para onde seguia a Estrada Geral do Jaguaribe.
Quixeramobim localizava-se no cruzamento das estradas que vinham de Granja, Sobral, Crateús, de Santa Quitéria e da Paraíba. Sobral ligava o sertão central com o litoral noroeste da Capitania. De Tauá, podia-se seguir tanto para Oeiras, no Piauí, passando por Crateús, como para Icó. Russas estava na estrada geral do Jaguaribe e Icó. Situada no cruzamento desta com a Estrada Nova das Boiadas, comunicava-se diretamente com o Piauí, com a Paraíba e com Aracati, no litoral cearense.
A vila do Aracati foi o principal porto do Ceará durante o século XVIII. Em seu espaço, localizavamse as principais oficinas de charque do período. Antes mesmo da elevação à condição de vila, comercializavase de “vinte a vinte cinco mil bois” para a produção de carne seca. Na segunda metade do século XVIII, no espaço da vila podia ser encontrado tanto o animal vivo como a carne salgada e ainda “couro de bois salgados, vaquetas, couro de cabra e pelicas brancas”. Anualmente, saíam do porto de Santa Cruz do Aracati cerca de 25 a 30.000 couros salgados, 50 a 60.000 meios de sola e “vaquetas”, 30 a 35.000 couros de cabra e 2 a 3.000 pelicas (ALMEIDA, 1887, p.85).
Icó foi o mais importante ponto de escoamento, no sertão, da produção cearense. Para a vila seguiam boiadas de todas as estradas e partiam outras tanto para o Aracati como para as feiras da Paraíba e de Pernambuco. Os fazendeiros localizados nas proximidades do Icó possuíam uma vantagem sobre os demais da Capitania do Ceará por estarem próximos das feiras de Pernambuco e da Paraíba. “Essa concorrência interna tornava-se particularmente incômoda para os habitantes do médio e baixo Jaguaribe que também tinham na pecuária os seus meios de vida, pois, de outro modo não lhes seria possível efetivar a posse das vastas sesmarias e delas obter o sustento” (NOBRE, 1977, p.42). Quixeramobim, a meio caminho da Estrada Nova das Boiadas, “com suas ricas pastagens, era o único ponto onde as reses derreadas pela canícula e pela fome podiam refazer-se na longa travessia” (STUDART FILHO, 1937, p.33). Granja localizava-se na bacia do Acaraú, a segunda mais importante do território, próximo ao porto de Camocim. Sobral garantia o contato entre o sertão e o porto do Acaraú, através de Granja (GIRÃO, 2000, p.179)."

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