quarta-feira, 5 de maio de 2010

Pior que novela ruim é o obscurantismo


O Ministério Público do Rio de Janeiro fez bobagem e ninguém protestou com a veemência necessária. Foi uma atitude ridícula, portadora da mais profunda ignorância.
Desde outubro do ano passado, o MP pega no pé da Globo exigindo que modifique as características da personagem Rafaela, interpretada pela menina Klara Castanho, na novela Viver a Vida.
Numa das notificações, recomendavam ao autor, Manoel Carlos, que tivesse “cuidado ao elaborar a personalidade de personagens cujos atores são menores de idade”.
Ameaçaram tomar as “medidas legais cabíveis” caso a emissora insistisse em apresentar a personagem como uma vilã. Mas que atrevimento! Agora eles também são dramaturgos?
Para quem não sabe, a pirralha da novela é uma chantagista bem mimada. Não é psicopata, sádica ou maquiavélica. É, no máximo, uma criança egoísta. Um personagem verossímil.
Pois a emissora aceitou a pressão. E os burocratas, do alto de sua arrogância, consideraram “satisfatórias” as mudanças feitas. Que papelão. Que retrocesso. E que omissão da mídia!
Desde quando o povo brasileiro delegou poder de veto estético aos excelentíssimos promotores? Pelo contrário, nossa Constituição garante a liberdade de expressão e proíbe qualquer tipo de censura.
Por que crianças não podem ser vilãs? Quem disse que o mito da inocência infantil resiste a um segundo de reflexão? Freud, Jung, Piaget, a Turma da Mônica, todo mundo sabe que as crianças podem cometer maldades, sim.
O cinema já mostrou esse tipo em bons filmes, como O Anjo Malvado, em que Macaulay Culkin é o diabinho em pessoa. Calar diante desse arbítrio não é bom para ninguém.
Nossas instituições devem estar a serviço da democracia, da cidadania, dos direitos coletivos. E não de preconceitos anacrônicos, desmentidos pela ciência e pelo bom senso.
A novela é bem ruinzinha, mas pior é o obscurantismo.

Marco Antonio Araujo
Fonte: http://noticias.r7.com/blogs/o-provocador/

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