Postado em
28 de junho de 2015 às 10:33 am
Janio de Freitas, na Folha:
Como inquérito “sob segredo de Justiça”, a Operação Lava Jato lembra
melhor uma agência de propaganda. Ou, em tempos da pedante expressão
“crise hídrica”, traz a memória saudosa de uma adutora sem seca.
Em princípio, os vazamentos seriam uma transgressão favorável à
opinião pública ansiosa por um sistema policial/judicial sem as
impunidades tradicionais. Mas, com o jorro contínuo dos tais vazamentos,
nos desvãos do sensacionalismo não cessam os indícios que fazem a “nova
Justiça” –a dos juízes e procuradores/promotores da nova geração– um
perigo equivalente à velha Justiça acusada de discriminação social e
inoperância judicial.
É
preciso estar muito entregue ao sentimento de vingança para não
perceber um certo sadismo na Lava Jato. O exemplo mais perceptível e
menos importante: as prisões nas sextas-feiras, para um fim de semana
apenas de expectativa penosa do preso ainda sem culpa comprovada.
Depois, a distribuição de insinuações e informações a partir de mera
menção por um dos inescrupulosos delatores, do tipo “Fulano recebeu
dinheiro da Odebrecht”. Era dinheiro lícito ou provou-se ser ilícito? É
certo que o recebedor sabia da origem, no caso de ilícita?
A hipocrisia domina. São milhares os políticos que receberam doações
de empreiteiras e bancos desde que, por conveniência dos candidatos e
artimanha dos doadores, esse dinheiro pôde se mover, nas eleições, sob o
nome de empresas. Nos últimos 60 anos, todos os presidentes tiveram
relações próximas com empreiteiros. Alguns destes foram comensais da
residência presidencial em diferentes mandatos. Os mesmos e outros
viajaram para participar, convidados, de homenagens arranjadas no
exterior para presidente brasileiro. Banqueiros e empreiteiros doaram
para os institutos de ex-presidentes. Houve mesmo jantares de
arrecadação no Alvorada e pagos pelos cofres públicos. Ninguém na Lava
Jato sabe disso?
Mas a imprensa é que faz o sensacionalismo. É. Com o vazamento deformado e o incentivo deformante vindos da Lava Jato.
A partir de Juscelino, e incluídos todos os generais-presidentes, só
de Itamar Franco e Jânio Quadros nunca se soube que tivessem relações
próximas com empreiteiros e banqueiros. A íntima amizade de José Sarney
foi mal e muito comentada, sem que ficasse evidenciada, porém, mais do
que a relação pessoal. Benefícios recebidos, sob a forma de trabalhos
feitos pela Andrade Gutierrez, foram para outros.
Ocorre mesmo, com os vazamentos deformantes, o deslocamento da
suspeita. Não importa, no caso, o sentido com que o presidente da
Odebrecht usou a palavra “destruir”, referindo-se a um e-mail, em
anotação lida e divulgada pela Lava Jato. O episódio foi descrito como
um bilhete que Marcelo Odebrecht escreveu com instruções para o seu
advogado, e cuja entrega “pediu a um policial” que, no entanto, ao ver a
palavra “destruir”, levou o bilhete ao grupo da Lava Jato.
Muito inteligível. Até que alguém, talvez meio distraído, ao contar o
episódio acrescentasse que Marcelo, quando entregou o bilhete e fez o
pedido ao policial, já estava fora da cela e a caminho de encontrar seu
defensor.
Então por que pediria ao policial que entregasse o bilhete a quem ele mesmo ia encontrar logo?
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/janio-de-freitas-hipocrisia-nos-ultimos-60-anos-todos-os-presidentes-tiveram-relacoes-com-em
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